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Cultura e opulência do Brasil - Culturatura.com.br

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PARA SE PISAR O TABACO, há de ser bem seco, ou ao sol, ou em bacias, ou fornos de co<strong>br</strong>e, <strong>com</strong> atenção<<strong>br</strong> />

para que não queime, e, por isso, se há de mexer continuamente; e os pilões em que se pisa hão de ser de<<strong>br</strong> />

pedra-mármore, <strong>com</strong> as mãos de pisar de pau. Pisa<strong>do</strong>, peneira-se, e o que estiver capaz, se tira à parte, e o<<strong>br</strong> />

mais grosso se torna a pisar, até se reduzir em pó. E este é o que <strong>com</strong>umente mais se procura e se estima.<<strong>br</strong> />

Do grani<strong>do</strong> se usa muito na Itália, e faz-se desta sorte. Toma-se o tabaco já feito em pó, e põe-se em um<<strong>br</strong> />

alguidar vidra<strong>do</strong>, bota-se-lhe em quantidade moderada algum mel ou calda de tabaco, e se esta for muito<<strong>br</strong> />

grossa, se fará líquida, <strong>com</strong> um pouco de vinho. Depois, para que se vá encorporan<strong>do</strong>, se mexe muito bem e,<<strong>br</strong> />

mexi<strong>do</strong>, se levanta e meneia-se entre as mãos, <strong>com</strong>o que faz bolinhos; e, estan<strong>do</strong> assim úmi<strong>do</strong>, se passa por<<strong>br</strong> />

uma oropema fina e nesta passagem pelos buraquinhos da oropema se formam os grani<strong>do</strong>s, <strong>com</strong>o os da<<strong>br</strong> />

pólvora fina, e fica o tabaco grani<strong>do</strong>. E o que não passa pelo oropema, por ser ainda grosso, torna-se a<<strong>br</strong> />

menear, <strong>com</strong>o está dito, entre as mãos, até ser capaz de passar. Passa<strong>do</strong>, se seca ao sol sem se mexer, para que<<strong>br</strong> />

não torne a amassar-se e perca o ser de grani<strong>do</strong>.<<strong>br</strong> />

Depois de o tabaco grani<strong>do</strong> estar seco, se lhe quiserem dar algum cheiro, borrifa-se <strong>com</strong> água cheirosa, ou<<strong>br</strong> />

põe-se no mesmo vaso em que se recolheu uma baunilha inteira, ou alguma quantidade de âmbar, ou de<<strong>br</strong> />

algália ou almíscar. Porém, o tabaco empó não é capaz de ser borrifa<strong>do</strong> <strong>com</strong> água cheirosa, porque <strong>com</strong> ela se<<strong>br</strong> />

amassaria e não ficaria, <strong>com</strong>o se pretendeu, solto em pó.<<strong>br</strong> />

O tabaco que se pisa no <strong>Brasil</strong> vai sem mistura, singelo e legítimo em tu<strong>do</strong>; e, por isso, tanto se estima. Mas, o<<strong>br</strong> />

que se pisa em algumas partes da Europa, vende-se tão vicia<strong>do</strong> que apenas merece o nome de tabaco, pois<<strong>br</strong> />

<strong>com</strong> ele até as cascas de laranja se pisam.<<strong>br</strong> />

VIII<<strong>br</strong> />

Do uso modera<strong>do</strong> <strong>do</strong> tabaco para a saúde, e da demasia nociva à mesma saúde, de qualquer<<strong>br</strong> />

mo<strong>do</strong> que use dele.<<strong>br</strong> />

OS QUE SÃO DEMASIADAMENTE AFEIÇOADOS ao tabaco o chamam erva santa, nem há epíteto<<strong>br</strong> />

de louvor que lhe não dêem para defender o excesso digno de repreensão e de nota. Homens há que, não<<strong>br</strong> />

podem viver sem este quinto elemento, cachimban<strong>do</strong> a qualquer hora em casa e nos caminhos, mascan<strong>do</strong> as<<strong>br</strong> />

suas folhas, usan<strong>do</strong> de torcidas e enchen<strong>do</strong> os narizes deste pó. E esta demasia não somente se vê nos<<strong>br</strong> />

mar´timos e nos trabalha<strong>do</strong>res de qualquer casta, forros e escravos, os quais estão persuadi<strong>do</strong>s que só <strong>com</strong> o<<strong>br</strong> />

tabaco hão de ter alento e vigor, mas também em muitas pessoas no<strong>br</strong>es e ociosas, nos solda<strong>do</strong>s dentro <strong>do</strong><<strong>br</strong> />

corpo da guarda, e em não pouco eclesiásticos, clérigos e religiosos, na opinião <strong>do</strong>s quais toda essa demasia se<<strong>br</strong> />

defende, ainda quan<strong>do</strong> se vê manifestamente que não se usa por mezinha, mas por dar gosto a um excessivo<<strong>br</strong> />

mal habitua<strong>do</strong> prurito. Eu, que de mo<strong>do</strong> algum uso dele, ouvi dizer que o fumo <strong>do</strong> cachimbo, bebi<strong>do</strong> pela<<strong>br</strong> />

manhã em jejum moderadamente, desseca as umidades <strong>do</strong> estômago, ajuda para a digestão e não menos para a<<strong>br</strong> />

evacuação ordinária, alivia ao peito que padece fluxão asmática e diminui a <strong>do</strong>r insuportável <strong>do</strong>s dentes.<<strong>br</strong> />

O mascá-lo não é tão sadio, porém, assim <strong>com</strong>o masca<strong>do</strong> pela manhã, em jejum, moderadamente, serve para<<strong>br</strong> />

dessecar a abundância <strong>do</strong>s humores <strong>do</strong> estômago, assim ouso imodera<strong>do</strong> o relaxa; e, pela continuação, o<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />

menos, altera o gosto, faz grave o bafo, negros os dentes, e deixa os beiços imun<strong>do</strong>s.<<strong>br</strong> />

Usam alguns de torcidas dentro <strong>do</strong>s narizes, para purgar por esta via a cabeça e para divertir os estilicídio que<<strong>br</strong> />

vaia a cair nas gengivas e causa <strong>do</strong>res de dentes, e,postas pela manhã eà noite, não deixam de ser de proveito.<<strong>br</strong> />

Só se en<strong>com</strong>enda, aos que usam delas, o evitarem a indecência que causa o aparecer <strong>com</strong> elas fora <strong>do</strong>s narizes<<strong>br</strong> />

e <strong>com</strong> uma gota de estilicídio sempre manante, que suja a barba e causa nojo a quem <strong>com</strong> eles conversa.<<strong>br</strong> />

Sen<strong>do</strong> o tabaco em pó o mais usa<strong>do</strong>, é certamente o menos sadio, assim pela demasia <strong>com</strong> que se toma, que<<strong>br</strong> />

passa de mezinha a ser vício, <strong>com</strong>o por impedir o mesmo costume excessivo <strong>do</strong>s bons efeitos que se<<strong>br</strong> />

pertendem e que talvez causaria se o uso fosse mais modera<strong>do</strong>. Deixan<strong>do</strong>, porém, de reparar nesta viciosa<<strong>br</strong> />

superfluidade, só lem<strong>br</strong>o quan<strong>do</strong> <strong>do</strong>us Sumos Pontífices, Urbano VIII e Inocêncio X, estranharam o usar dele<<strong>br</strong> />

nas igrejas, pela indecência que repararam e julgaram ser este intolerável abuso digno de se notar e estranhar<<strong>br</strong> />

nos seculares e mais nos eclesiásticos pouco acautela<strong>do</strong>s, ainda quan<strong>do</strong> assistem no coro aos ofícios divinos, e<<strong>br</strong> />

muito mais nos religiosos, que devem dar exemplo a to<strong>do</strong>s (e maiormente nos lugares sagra<strong>do</strong>s) de gravidade<<strong>br</strong> />

e modéstia. E, por isso, ambos os so<strong>br</strong>editos pontífices chegaram a proibi-lo, <strong>com</strong> ex<strong>com</strong>unhão maior; o<<strong>br</strong> />

primeiro, <strong>com</strong> um <strong>br</strong>eve de 30 de janeiro <strong>do</strong> ano de 1642, o proibiu na igreja de São Pedro em Roma e no adro<<strong>br</strong> />

e alpendre <strong>do</strong> dito templo, o segun<strong>do</strong> <strong>com</strong> outro <strong>br</strong>eve, debaixo da mesma pena, aos 8 de janeiro de 1650, nas

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