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2 4 6 JERÓNIMO DE BRITO
estilos (“humilde, meão e grave”) através dos quais a língua portuguesa podia luzir
e demonstrar a sua superioridade sobre os demais idiomas modernos, escrevia:
«Que direi do estilo humilde e jocoso, o qual parece que em nenhũa outra língua
pode ter a graça e elegância com que Lourenço de Cáceres, Fernão Cardoso e Luís
de Camões compuseram as suas cartas e outras semelhantes obras?» 13
Uma vez confirmado o que os dois biógrafos de Brito escreveram acerca dos
superiores dotes intelectuais que exornavam o progenitor, não deixou de nos causar
alguma estranheza o silêncio que guardaram relativamente aos estudos académicos
do nosso Autor, como que restringindo toda a sua preparação tanto intelectual como
religiosa ao ano de noviciado passado no convento de Benfica, o que é francamente
inverosímil e nos levou, já cientes da verdadeira identidade do autor da Oratio, a
procurar o seu rasto no meio académico coimbrão ao qual ele necessariamente estava
ligado, não apenas na sua qualidade de orador convidado, como na de Mestre, com
que aparece designado na página de rosto do seu opúsculo latino de 1554. E, de
facto, como vai ver-se, não faltam provas da sua presença na Academia de Coimbra.
Assim, se consultarmos O processo na Inquisição de Mestre João da Costa, 14
ficaremos a saber que, no rol de testemunhas de defesa indicadas pelo réu, se
encontra o nome do nosso Autor, 15 o qual foi interrogado pelos inquisidores no dia
12 de Janeiro de 1551. Transcrevamos as palavras processuais que, além de ricas
de informação biográfica, mostram da parte do declarante a ausência de qualquer
propósito de prejudicar o acusado:
«[177] Item Jerónimo de Brito, capelão del-rei nosso Senhor, testemunha a que foi
dado juramento dos santos Evangelhos, em que ele pôs a mão, e preguntado polo
custume e cousas dele, disse que era amigo do réu, e porém que diria a verdade.
Item preguntado polo outavo artigo da dita defesa, que lhe foi lido etc., disse
ele testemunha que era verdade que ele testemunha viu algũas vezes o réu fazer as
práticas conteúdas no artigo, encomendando aos colegiais e ouvintes do Colégio
que fossem bons e vertuosos e que se confessassem e tomassem o santo sacramento
e servissem a Nosso Senhor mais por amor que por temor, e assi ouviu dizer ao
réu algũas vezes aos ouvintes do dito Colégio que fizessem de maneira que suas
vertudes soassem fora, pera que se soubesse que no Colégio se ensinava vertude e
boa doutrina, e que ele testemunha viu sempre ao réu ter bom zelo nas cousas de
serviço de Nosso Senhor. E deste mais non disse.
Item preguntado polo undécimo artigo da dita defesa que lhe foi lido, disse
ele testemunha que assi passava como o réu dizia em seu artigo scilicet de fazer
as precisões da dita maneira com toda boa ordem e muito devotas, levando todos
seus livros s. os pequininos, e mandando chamar os clérigos de fora e fazia de
13
Manuel Severim de Faria, Discursos Vários Políticos, Lisboa, INCM, 1999, p. 92. A 1ª edição
saiu dos prelos de Manuel Carvalho, em Évora, no ano de 1624.
14
Edição de Mário Brandão, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1944.
15
O. c., p. 115.