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2 5 8 JERÓNIMO DE BRITO
Das palavras que, no prefácio-dedicatória, dirige ao monarca colhe-se, como
atrás vimos, que a sua ida para Coimbra, onde se graduara em Artes e cursava então
Teologia, se ficaria a dever ao incitamento do destinatário, que, ao que indicam as
fontes históricas, sentia grande apreço por Fernão Cardoso, pai de Jerónimo de Brito.
No exórdio da Oratio, o nosso Autor alude à responsabilidade que cabe ao
Cancelário da Universidade pela escolha do seu nome para o desempenho daquele
papel na cerimónia com que se oficializava a abertura do ano escolar: «qui, quod
optimo iure poterat imperare, beneuole et amice postulans,[...] ad hoc tamen munus
tractandum designauerit.» (“o qual, rogando bondosa e amigavelmente aquilo que
com todo o direito poderia ordenar, [...] indicou-me para tratar deste assunto.”). P. 6.
Não será de descartar a possibilidade de aquela “bondade e amizade” com as
quais D. Clemente da Silva instou junto de Brito para movê-lo a pronunciar a Oração
académica derivasse de laços de família que os uniriam e que nos atrevemos a
sugerir, atendendo ao facto de ambos procederem de senhoras de apelido Távora. 42
Passando aos louvores das diferentes ciências, não é de estranhar que um aluno
de Teologia – à qual aliás cabia então a primazia no elenco dos saberes – se ocupe
de modo significativamente mais dilatado com os da sua Faculdade que com os das
demais, merecendo-nos sim algum reparo o modo talvez excessivamente alusivo
como trata de algumas, como é o caso, por exemplo, da Geometria, Aritmética e
Gramática. Depois dos estudos teológicos, são a Música e a Eloquência as áreas de
saber sobre que mais se derrama, o que talvez tenha uma explicação psicológica se
nestas, por um lado, virmos as actividades mais “artísticas” (no sentido de “artes do
belo”) de quantas compunham o currículo académico de então, e, por outro, nos
recordarmos da excepcional vocação para a pintura que tanto frei Luís de Sousa
como Inácio de Morais atribuíram a Jerónimo de Brito. A propósito, e tendo em
conta esta sensibilidade estética, devemos confessar que não foi sem estranheza que
verificámos a quase nula presença da poesia e dos poetas no corpo desta Oratio, 43
ao invés do que sucede com as suas congéneres reunidas neste volume, com a só
excepção da de Arnaldo Fabrício, que nos aparece como igualmente infenso às musas.
Sem embargo do parcimonioso desenvolvimento que o Autor deu aos núcleos
temáticos que estava obrigado a glosar, estranhamente o recurso retórico a que mais
amiúde parece recorrer é aquele que, entre as figuras que a preceptista tradicional
incluía na rubrica das figurae per detractionem, recebia o nome de praeteritio. 44
42
A mãe de D. Clemente e a bisavó paterna de Jerónimo de Brito. Vd. nota 8 desta
Introdução e nota 4 ao Texto da Oração.
43
As excepções são: a) na p. 14, a breve citação do fr. 129 Snell, de Píndaro, procedente
de um passo doutrinal de Platão; b) e, na p. 29, a sumária alusão às “Musas Carmentas”, que,
“mediante uma certa agradável diversidade de ritmos”, compõem diversos cantares.
44
“É uma referência à situação do discurso e consiste em anunciar expressamente a
intenção de deixar de lado o tratamento exaustivo de um objecto referido ou de vários objectos
referidos no discurso.” Heinrich Lausberg, Elementos de Retórica Literária, tradução de
R. M. Rosado Fernandes, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, pp. 243-244.