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2 4 4 JERÓNIMO DE BRITO
na corte del-rei D. João o III por excelências de aviso e ditos agudos, que falando
dele com alguns velhos mo nomearam pelo grande Fernão Cardoso. [...] Foi de
geração nobre e por tal casou em Santarém com Filipa de Brito, senhora principal
[...] da qual teve muitos filhos, e foram terceiro e quarto Jerónimo de Brito e Fernão
Cardoso, que tomaram o hábito neste convento e tiveram a boa ventura de serem
discípulos nele do grande espírito de D. frei Bertolameu dos Mártires, arcebispo
de Braga, sendo aqui prior antes de sua eleição em arcebispo. Do Jerónimo dizem
que o cardeal D. Henrique lhe mandou que fosse frade e, porque honrou o dia
de sua entrada com sua presença, agradecido o moço trocou o nome da pia em
Henrique e o da geração em S. Jerónimo, e chamou-se frei Henrique de S. Jerónimo.
O Fernando, contando muitos apelidos honrados na linha de sua mãe e querendo
esconder-se do mundo, polo muito que seu pai era conhecido nele, deixou o
Cardoso e chamou-se Távora, e foi causa que por Távoras fossem despois muito
conhecidos ambos os irmãos. [...] Foi natural em ambos uma inclinação à pintura
que, se fora ajudada com trabalho e arte, os pudera fazer tão insignes como os
grandes que celebra a Antiguidade. [...] Frei Henrique [...] estava governando o nosso
convento de S. Domingos de Évora, de que era prior, [...] foi chamado pera bispo de
[...] Cochim na Índia. Era entrado o ano de 1566. [...] tal conta deu de si no cargo
que, vagando a cadeira de Goa, [...] o mandou el-rei passar a ela. [...] Foi a última
cidade que visitou Chaul [...]. Sentiu-se um castigado [...] determinou vingar-se [...]
soube tão bem temperar a peçonha e o modo de a dar que não foi entendida. [...]
Foram dous os colhidos na treição [...] um o arcebispo, o outro seu companheiro.
Este resistiu ao mal, como robusto que era de forças e idade, e ajudado de muitos
antídotos, com que se lhe acudiu, sustentou a vida; o santo arcebispo era entrado
em dias e fraco de compreição, não lhe valeu nenhum remédio e acabou logo.» 5
Como complemento às notícias aqui transcritas, o mesmo cronista de S. Domingos
nos remete para a sua Vida de D. Frei Bartolomeu dos Mártires, obra onde as passagens
alusivas à ida de frei Henrique a Trento como companheiro do prelado bracarense
serão mais adiante e em ensejo mais adequado por nós lembradas.
Neste momento parece justo contribuirmos com algumas achegas de nossa colheita
para vincar, corrigir ou completar alguns dos traços que a fisionomia de Jerónimo
de Brito já foi tomando aos nossos olhos.
Assim, a primeira observação que nos ocorre, e que tira quaisquer dúvidas
sobre a identidade do autor da Oratio académica com o jovem santareno do mesmo
nome, é a paixão pela pintura, que chamou a atenção tanto de Inácio de Morais, 6
no poema laudatório latino com que contribuiu para a brochura do amigo, como de
5
Frei Luís de Sousa, História de S. Domingos, Porto, Lello e Irmão Editores, 1977, volume 1º,
pp. 859-863.
6
Veja-se infra, Oratio, p. 2*. É também curiosa a aproximação que ambos os escritores
estabelecem: com os modelos da Antiguidade, de forma genérica, no caso de frei Luís de
Sousa, e Apeles, no caso de Inácio de Morais.