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ORAÇÃO DE TODAS AS CIÊNCIAS E SABERES
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expectativa que se calhar concebestes a meu respeito, se não tivesse por juiz a
vossa singular indulgência e extraordinário comedimento, mediante a qual avaliais
não tanto o valor da dádiva oferecida, quanto a intenção de quem oferece) não me
sentisse dominado por um enorme terror e receio. Motivo pelo qual vos rogo e [7]
suplico, excelentíssimos varões, que me presteis hoje aquela atenção, a mim que
desejo dizer alguma coisa sobre os vossos merecimentos e que vos felicito pelos
vossos estudos, que costumastes mostrar a outros que falavam acerca da virtude.
Portanto, ao propor-me falar acerca das ciências e expor os louvores das
mesmas, quis começar antes de mais por aquela que assaz se avantaja às restantes
e de longe as supera, da qual como de uma nascente límpida emanaram todas as
demais artes (é que dava visos que o método assim o exigia), por forma a que
nos ouvidos dos ouvintes, que devido a uma espécie de debilidade da natureza
sempre no início estão mais disponíveis para escutar e no final mais desatentos,
permanecesse alguma coisa relativa a esta ciência, que ajudasse sobremaneira aos
restantes estudos daquelas coisas com as quais eles, desprezando tudo o mais, se
deleitam, e fosse não pequeno incitamento para prosseguirem com entusiasmo
para aqueles aos quais ela já ofereceu muito e que a ela se entregaram durante
muito tempo. E ao pensar assim não me limitei a dar crédito ao meu parecer, mas,
imitando aquele santo varão Noé, o qual, segundo se diz, ensinou aos filhos em
primeiro lugar os preceitos da Teologia e depois as Matemáticas e a Filosofia, eu
considerei que deveria falar primeiro acerca da Teologia.
Por conseguinte, começando por aqui, sendo certo que Deus Óptimo Máximo
criou os homens a partir do nada e lhes concedeu os mais perfeitos ornamentos
quer do corpo quer do espírito, [8] para os brutos animais lhes obedecerem,
por forma a senhorearem e governarem este globo a que chamam Terra, de tão
grande esplendor e brilho e pintado com maravilhosa formosura. Mas eles devido
à arrogância, perpetrando um crime abominável com desprezo pela majestade
divina, como atentaram contra a majestade celestial de Deus e com o seu excessivo
desatino violaram as ordens do melhor dos pais, caíram num lamentável infortúnio
e, passando a levar uma vida de brutas alimárias, perderam, manchando-a, aquela
divina potência de conhecer derivada daquele Criador das coisas, graças à qual o
seu entendimento e razão eram perfeitos. Aquele bondoso Pai, porém, compadecido
deles e vendo o grande número de desgraças em que tinham caído devido ao
pecado, não permitiu que perecessem privados de ajuda os homens que moldara
com inexcedível perfeição e não deixou de lhes conceder uma espécie de instinto
natural e um lume de sabedoria divina, a fim de que, indagando a sua origem e
a causa primeira das cousas, como que recordando donde tinham provindo, se
sentissem estimulados pelo desejo das coisas divinas. É que não existe povo algum
tão selvagem nem houve nenhum mortal tão desumano que não tivesse inculcada
em seu espírito a crença em Deus. E até todos a tal ponto reconheceram alguma
força e natureza divina que, mesmo que ignorassem que espécie de Deus cumpria
que existisse, todavia sabiam que deveria existir. 5 Os quais, ainda que [9] em grande
Teologia