Cartas Do Brasil - Brasiliana USP
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CARTA DO BRASIL (1549)<br />
gente dócil. Somente temo o mau exemplo que o nosso Christianismo<br />
lhe dá, porque ha homens que ha sete e dez annos que se não<br />
confessam e parece-me que põem a felicidade em ter muitas mulheres.<br />
<strong>Do</strong>s sacerdotes ouço cousas feias. Parece-me que devia Vossa<br />
Reverendissima de lembrar a Sua Alteza um Vigário Geral, porque<br />
sei que mais moverá o temor da Justiça que o amor do Senhor.<br />
E não ha óleos para ungir, nem para baptisar; faça-os Vossa Reverendissima<br />
vir no primeiro navio, e parece-me que os havia de trazer<br />
um Padre dos nossos (*).<br />
Também me parece que mestre João (10) aproveitaria cá muito,<br />
porque a sua lingua é similhante a esta e mais aproveitar-noshemos<br />
cá da sua theologia.<br />
A terra cá achamol-a boa e sã. Todos estamos de saúde, Deus<br />
seja louvado, mais sãos do que partimos.<br />
As mais novas da terra e da nossa cidade os Irmãos escreverão<br />
largo e eu também pelas naus quando partirem. Crie Vossa Reverendissima<br />
muitos filhos para cá, que todos são necessários. Eu<br />
um bem acho nesta terra que não ajudará pouco a permanecerem<br />
depois na Fé, que é ser terra grossa, e todos têm bem o que hão mister,<br />
e a necessidade lhes não fará prejuízo algum. Estão espantados<br />
de ver a magestade com que entramos e estamos, e temem-nos<br />
muito, o que também ajuda. Muito ha que dizer desta terra; mas<br />
deixo-o ao commento dos charissimos Irmãos. O Governador é es-<br />
(*) A carência de óleo foi depois supprida pelo da arvore cabureiba, que<br />
o Summo Pontífice declarou por "matéria legitima da santa unção e ehrisma,<br />
e como tal se mistura e sagra com os santos óleos onde falta o da Pérsia",<br />
Frei Vicente do Salvador, Historia ão <strong>Brasil</strong>, 30, ed. de 1918. — G.<br />
(10) Refere-se provavelmente ao padre Misser João, aragonez. D'elle<br />
diz Franco: "Foi capellão das Infantas de Castella D. Maria, Imperatriz, e<br />
D. Joanna, mãe d 'El-Rei D. Sebastião; foi recebido pelo padre Pedro Fabro<br />
em Lovayna e d'ali mandado ter seu noviciado em Coimbra no anno de 1544.<br />
Sempre deu mostras de muita virtude, em especial sendo companheiro do padre<br />
mestre Simão, quando sendo mestre do Príncipe D. João o aecompanhava<br />
á corte, na qual a todos era exemplo de rara santidade. Era amparo de pobres,<br />
viuvas e necessitados, zeloso do bem das almas, incansável em confessar;<br />
tinha particular graça para trazer a gente ás confissões. Morreu em Lisboa na<br />
Casa de Santo Antão o Velho aos 2 de Março de 1553." (Imag. da vvrt. ão<br />
Coll. de Coimbra, II, pg. 572).<br />
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