a consciência em crise na narrativa de clarice lispector
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Nos termos da lógica <strong>de</strong> mercado capitalista, “O dinheiro enquanto<br />
dinheiro não se materializa <strong>em</strong> bens; convertese <strong>em</strong> riqueza, caracterizando a<br />
prática do “entesouramento”; acumulado, não distribui renda, ape<strong>na</strong>s concentra.<br />
Per<strong>de</strong> a sua função <strong>de</strong> valor <strong>de</strong> troca pela sua indisponibilida<strong>de</strong> para circulação”<br />
(MARX: 1977,125126). Desse modo, “A apropriação da riqueza <strong>na</strong> sua forma geral,<br />
implica assim a renúncia à riqueza <strong>na</strong> sua realida<strong>de</strong> material” (MARX: 1977, 125).<br />
No caso da protagonista, t<strong>em</strong>se uma estranha equação <strong>em</strong> que, transformada <strong>em</strong><br />
riqueza, a acumulação, ao invés <strong>de</strong> traduzirse <strong>em</strong> sinônimo <strong>de</strong> realização pessoal<br />
produz efeito inverso. A situação economicamente privilegiada <strong>de</strong> que <strong>de</strong>sfruta faz<br />
com que ela seja credora <strong>de</strong> um comportamento i<strong>de</strong>ntificado com o substrato<br />
material <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>nte; advindo daí, <strong>de</strong>ntre outros valores, o<br />
individualismo <strong>de</strong> classe, que t<strong>em</strong> como sua contraparte a supr<strong>em</strong>acia do<br />
pensamento da classe domi<strong>na</strong>nte. Posta <strong>em</strong> diálogo com a nossa história recente,<br />
refirome aos anos <strong>de</strong> chumbo, G.H. <strong>de</strong>spontaria como privilegiada figuração entre<br />
aqueles que enriqueceram à custa da acumulação proporcio<strong>na</strong>da pela política<br />
econômica concentracionista, a qual nos foi aplicada nos anos do golpe.<br />
Um aspecto fundamental da estrutura <strong>de</strong> classes da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira po<strong>de</strong> ser observado <strong>na</strong> forma pela qual se distribui a<br />
renda. Entre 1960 e 1970, cresceu bastante a renda do contingente<br />
mais rico da socieda<strong>de</strong> brasileira, ao passo que caiu a <strong>de</strong> todos os<br />
outros segmentos da socieda<strong>de</strong>. Conforme os dados disponíveis, os<br />
5% superiores da população r<strong>em</strong>unerada tiveram a sua participação<br />
<strong>na</strong> renda aumentada <strong>de</strong> 27, 4% para 36,2%, ao passo que os 50%<br />
inferiores caíram <strong>de</strong> 17,7% para 13,7% (IANNI:2004, 291).<br />
No âmbito da <strong>na</strong>rrativa <strong>de</strong> Lispector, a explicitação <strong>de</strong>ste probl<strong>em</strong>a não se<br />
dá <strong>de</strong> maneira tão simples. Isto porque, ao reconhecer <strong>na</strong> <strong>em</strong>pregada ausente o seu<br />
“outro <strong>de</strong> classe”, a <strong>na</strong>rradora começa a introjetar através do olhar fantasmagórico<br />
que aquela lhe transmite uma censura não ape<strong>na</strong>s <strong>em</strong> relação ao modo<br />
discrimi<strong>na</strong>tório com que s<strong>em</strong>pre fora tratada, mas, igualmente, o fato <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrirse<br />
<strong>na</strong> incômoda posição <strong>de</strong> exercitar uma forma <strong>de</strong> pensamento culturalmente arcaico,<br />
o qual inter<strong>na</strong>lizara no convívio com a classe domi<strong>na</strong>nte. O périplo conflituoso da<br />
protagonista irá situarse no cerne <strong>de</strong>sse probl<strong>em</strong>a, pois ela passa a elaborar uma<br />
leitura crítica <strong>de</strong> todos os valores que, até então, consi<strong>de</strong>rava como autênticos s<strong>em</strong><br />
que sobre estes jamais lhe tivesse pairado qualquer dúvida. Vejase, <strong>na</strong> ce<strong>na</strong><br />
seguinte, como ela reflete acerca <strong>de</strong> sua transformação <strong>de</strong> “crisálida <strong>em</strong> larva<br />
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