a consciência em crise na narrativa de clarice lispector
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como se aqueles se constituíss<strong>em</strong> numa ca<strong>de</strong>ia sucessiva <strong>de</strong> eventos causais<br />
estacio<strong>na</strong>dos no t<strong>em</strong>po. Além disso, o contexto no qual se situa o autor é o início da<br />
Revolução Industrial, possivelmente, a segunda meta<strong>de</strong> do século XIX. Naquele<br />
momento, a mo<strong>de</strong>rnização provocada pelo capitalismo <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ou mudanças<br />
sensíveis no comportamento das pessoas <strong>em</strong> conseqüência, também, da crescente<br />
migração das populações das zo<strong>na</strong>s agrárias para o espaço urbano. Por outro lado,<br />
o consumo estimulado pelo capitalismo levou o hom<strong>em</strong> a conviver com a cultura da<br />
aparência, tor<strong>na</strong>ndose refém dos incontroláveis efeitos da alie<strong>na</strong>ção proporcio<strong>na</strong>da<br />
pelo fetiche da mercadoria. Logo, a se<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo revelouse <strong>na</strong> sua contraparte<br />
a valorização da imag<strong>em</strong> <strong>em</strong> larga escala.<br />
Indose mais além <strong>na</strong> visão alegórica proporcio<strong>na</strong>da pelo fragmento <strong>de</strong><br />
Benjamin, dirseia que este é indiciador da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong> um contexto<br />
histórico como “causa ausente”, ou seja, através do “nãodito”. Interpretada a partir<br />
<strong>de</strong>sse viés, a história não se apóia simplesmente no referente, <strong>em</strong>bora <strong>de</strong>le seja<br />
impossível afastarse, posto que o ressignifica “retextualizandoo”. Assim,<br />
[...] a História não é um texto, ou uma <strong>na</strong>rrativa, mestra ou não, mas<br />
que, como causa ausente, énos acessível ape<strong>na</strong>s sob a forma<br />
textual, e que nessa abordag<strong>em</strong> <strong>de</strong>la e do Real passa<br />
necessariamente por sua textualização prévia, sua <strong>na</strong>rrativização no<br />
inconsciente político (JAMESON: 1992, 3132).<br />
Portanto, do ponto<strong>de</strong>vista <strong>de</strong> minha abordag<strong>em</strong>, seria pouco<br />
esclarecedor <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> associar o discurso alegórico da <strong>na</strong>rrativa da autora a uma<br />
questão que perpassa o contexto <strong>de</strong> publicação da obra. Refirome, como num<br />
momento antece<strong>de</strong>nte, às turbulências <strong>de</strong> cunho políticoi<strong>de</strong>ológicas do período <strong>de</strong><br />
repressão do regime militar brasileiro. Sendo assim, como não perceber no locus <strong>de</strong><br />
enunciação da <strong>na</strong>rradora os registros sublimi<strong>na</strong>res do mea culpa da classe<br />
domi<strong>na</strong>nte brasileira, cúmplice que foi, dos interesses voltados para a preservação<br />
do pensamento heg<strong>em</strong>ônico, <strong>de</strong> arregimentar as forças que instituíram o golpe?<br />
Partindo <strong>de</strong>sse princípio, comparese a ce<strong>na</strong> <strong>em</strong> que a perso<strong>na</strong>g<strong>em</strong> insere<br />
<strong>na</strong> sua confissão <strong>de</strong> culpa a presença <strong>de</strong> vozes anônimas, que nós inferimos como<br />
uma referência indireta ao contexto da repressão militar <strong>em</strong> que as verda<strong>de</strong>s eram<br />
arrancadas mediante força física:<br />
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