Anu-Pre e secao1 - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
Anu-Pre e secao1 - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
Anu-Pre e secao1 - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
46<br />
Após suas primeiras manifestações nos anos setenta, os movimentos sociais urbanos ampliaram<br />
as reivindicações frente ao Estado. As respostas governamentais procuraram a <strong>de</strong>scentralização (eventualmente,<br />
municipalização) dos serviços sociais urbanos: transportes, abastecimento, educação e saú<strong>de</strong>,<br />
habitação e saneamento. Em <strong>Belo</strong> <strong>Horizonte</strong>, como em outras capitais, no bojo das variações do jogo<br />
político-partidário das administrações estaduais e municipais, práticas clientelistas foram resgatadas. Assim,<br />
conselhos comunitários e setoriais, administrações regionais e programas públicos criados com o objetivo<br />
formal <strong>de</strong> <strong>de</strong>scentralizar o processo <strong>de</strong> gestão e/ou incentivar a participação popular na administração<br />
municipal, atuaram <strong>de</strong> fato no sentido <strong>de</strong> cooptar as centenas <strong>de</strong> associações comunitárias já em ativida<strong>de</strong>,<br />
criadas em sua imensa maioria a partir <strong>de</strong> 1974. 7<br />
A mobilização social urbana ganhou corpo e intensida<strong>de</strong> principalmente quando a crise da<br />
economia brasileira, como também a crise fiscal do Estado, começaram a se agudizar. Depois <strong>de</strong> uma década<br />
sem crescimento econômico mas com alta inflação e altos juros sobre as crescentes dívidas interna e externa,<br />
o Estado brasileiro se viu incapaz <strong>de</strong> dar continuida<strong>de</strong> ao suporte direto (e indireto) ao gran<strong>de</strong> capital<br />
para manter o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong>senvolvimentista exportador que caracterizou o milagre brasileiro. Assim, o arremedo<br />
<strong>de</strong> um Estado do Bem Estar seletivo e elitista que vinha se esboçando aos trancos e retrancas nas sobras<br />
do <strong>de</strong>senvolvimentismo, se viu <strong>de</strong>smontado e confinado ao nível local, ao município.<br />
Os municípios, politicamente fortalecidos a partir da Constituição <strong>de</strong> 1988, mas financeira e<br />
institucionalmente <strong>de</strong>stituídos das condições objetivas para enfrentar os gran<strong>de</strong>s problemas sociais e econômicos<br />
do país – <strong>de</strong>semprego, (<strong>de</strong>s)educação, saú<strong>de</strong>, insalubrida<strong>de</strong>, habitação, anomia social, violência,<br />
pobreza – tiveram que assumir a conta do bem estar social. A nível nacional, muito ao contrário, o mo<strong>de</strong>lo<br />
voltado para criar as condições gerais <strong>de</strong> produção necessárias ao capital multinacional na construção do<br />
país dos ricos – as elites e classes médias, os consumidores dos bens fordistas - agravou e aprofundou os<br />
níveis <strong>de</strong> exclusão social e econômica, ampliando a miséria urbana (e rural). O país dos pobres foi relegado<br />
ao nível local e o município, reduto final do Estado do Bem Estar, há que enfrentar os problemas societários<br />
gerados por uma economia perversa e governos comprometidos com o gran<strong>de</strong> capital 8 .<br />
A partir <strong>de</strong> então, aguçou-se a luta entre o Estado e a socieda<strong>de</strong> civil, esta cada vez mais<br />
organizada e mobilizada, não apenas nas áreas urbanas mas em todo o espaço nacional (virtualmente urbano).<br />
O espaço social brasileiro se (re)politizou, forçando o discurso político-partidário a incorporar questões<br />
e ban<strong>de</strong>iras trazidas à Constituinte como expressões das <strong>de</strong>mandas populares do quotidiano colocadas<br />
pela socieda<strong>de</strong> organizada. Tais questões ten<strong>de</strong>ram a permear o discurso <strong>de</strong> todos os partidos e candidatos:<br />
<strong>de</strong> punhos cerrados, mostrando os cinco <strong>de</strong>dos da mão, explorando um coração sentido... todos sensibilizados<br />
e i<strong>de</strong>ntificados com a justiça social e as carências da pobreza urbana (e rural). A transformação do<br />
discurso em ação, entretanto, tem sido luta cerrada, capitaneada pela mobilização política dos grupos<br />
sociais organizados e pelos partidos comprometidos com a causa popular, que conseguiram assim dar o tom<br />
do <strong>de</strong>bate político no país, mas não conseguiram promover mudanças expressivas no quadro <strong>de</strong> pobreza e<br />
<strong>de</strong>sesperança nacional.<br />
Não obstante, novas teorias e práticas <strong>de</strong> gestão e planejamento local vêm surgindo como<br />
tentativas <strong>de</strong> resposta às <strong>de</strong>mandas políticas da socieda<strong>de</strong> urbana. No planejamento, a discussão vem se<br />
<strong>de</strong>slocando da velha dicotomia entre técnica e política, ou seja, da tradicional polarização entre a reforma<br />
social, promovida <strong>de</strong> cima para baixo a partir das elites e da tecnocracia, e a mobilização social, <strong>de</strong> baixo<br />
para cima, a partir das bases populares e vanguardas políticas, para uma posição terceira que Friedmann<br />
(1989) chamou <strong>de</strong> aprendizado social. Nesta perspectiva, o saber e organização tecno-burocráticos <strong>de</strong>vem<br />
ser reconhecidos em sua operacionalida<strong>de</strong>, como também o <strong>de</strong>vem ser o saber e a mobilização populares. A<br />
premissa central é a incorporação dos grupos sociais, antes vistos como usuários, clientes e/ou consumidores,<br />
isto é, como objeto do planejamento, agora vistos como parceiros e efetivos sujeitos do planejamento,<br />
numa abordagem que preten<strong>de</strong> privilegiar a horizontalida<strong>de</strong> nas relações entre o po<strong>de</strong>r público/saber técnico<br />
e a organização social/saber popular. Como resultado, observa-se um <strong>de</strong>slocamento do po<strong>de</strong>r do planejamento<br />
das mãos do Estado para a socieda<strong>de</strong> civil organizada, bem como do monopólio do saber técnico para<br />
os grupos sociais (associações, ongs, movimentos populares, parcerias várias) através <strong>de</strong> seus próprios<br />
membros ou <strong>de</strong> alianças com setores técnicos, acadêmicos e mesmo empresariais.<br />
7<br />
SOMARRIBA et al. (1984) mostram que 131, das 202 associações comunitárias existentes em BH em 1980, foram criadas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1974 (sendo 1978<br />
o ápice, com 46 novas associações). O crescimento persistiu na década <strong>de</strong> 80, totalizando 548 associações em 1993. (SOMARRIBA, 1993).<br />
8<br />
Conquistas fe<strong>de</strong>rais importantes, como o Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e a <strong>Pre</strong>vidência Social, apesar da precarieda<strong>de</strong> e injustiça social que expõem (e<br />
escon<strong>de</strong>m), não <strong>de</strong>vem ser menosprezadas.