Felicidade-genuína-B.-Alan-Wallace
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do corpo, o cérebro e o sistema nervoso perdem a sua capacidade de dar<br />
sustentação à psique, que por fim desaparece. Mas, de acordo com os<br />
contemplativos budistas, a psique não desaparece sem deixar vestígios. Como no<br />
cultivo de shamatha, a psique se dissolve na consciência substrato, que segue de<br />
uma vida para outra. Em seguida, na fase culminante do processo de morte, até<br />
mesmo a consciência substrato se torna dormente e todas as dimensões da<br />
consciência são reduzidas à extrema simplicidade de rigpa, que se manifesta<br />
naquele momento como a clara luz da morte.<br />
A clara luz da morte, que não é outra senão a sua própria natureza búdica, é<br />
não nascida. Ela não surge na dependência de causas e condições, nem é<br />
condicionada pelo seu cérebro ou pelo ambiente. Sendo assim, não está sujeita a<br />
morte e decrepitude. Você pode aprender, ainda em vida, a soltar as fixações em<br />
níveis cada vez mais sutis – liberando a sua mente, a sua fala, o seu corpo, a sua<br />
história pessoal. Ao repousar profundamente nessa consciência prístina, sabendo<br />
que a consciência primordial e não nascida remanescente é quem você é – você<br />
não morre. Essa é uma abordagem prática da imortalidade, mesmo que seu<br />
corpo morra e sua psique desapareça.<br />
Aqueles que são capazes de reconhecer a natureza da consciência, quando<br />
estão na sequência final de experiências do processo de morrer comumente,<br />
permanecem na clara luz da morte durante dias ou semanas, ou, raramente,<br />
mesmo durante meses. Nesse período, os batimentos cardíacos, a respiração e<br />
todos os sinais metabólicos são interrompidos. Mas eles ainda estão meditando.<br />
Resta um calor na região do coração e o corpo não se decompõe. Hoje em dia,<br />
se discute pouco sobre a veracidade desse fenômeno. Ele foi presenciado por<br />
muitas pessoas, budistas e não budistas, incluindo médicos, mais recentemente.<br />
A primeira vez que vi evidências desse fenômeno foi em 1992, quando estava<br />
em Dharamsala, na Índia, com um grupo de neurocientistas que estudavam<br />
iogues tibetanos avançados. Assim que chegamos à cidade, recebemos uma<br />
mensagem do gabinete de Sua Santidade o Dalai Lama incentivando-nos a ir<br />
rapidamente para a casa de Ratö Rinpoche, um lama tibetano idoso que vivia no<br />
exílio perto da sede do governo tibetano. A sua respiração e os seus batimentos<br />
cardíacos haviam cessado seis dias antes, e os seus assistentes observaram que o<br />
seu corpo não havia se deteriorado e que se mantinha um calor em seu coração.<br />
Os neurocientistas e eu chegamos poucas horas depois de ele ter encerrado essa<br />
meditação final na clara luz da morte, o que era indicado pelos primeiros sinais<br />
de decomposição física. O seu corpo mal havia começado a desfalecer e não<br />
havia nenhum odor desagradável no quarto.<br />
Ratö Rinpoche foi reconhecido como um tulku, a reencarnação de um mestre<br />
altamente realizado, quando era criança pequena. Ele nasceu, por assim dizer,<br />
como um aristocrata espiritual, recebendo treinamento de professores realizados<br />
desde criança. Mas nem todos que exibem a realização da clara luz da morte são