demo comunicação e cultura - Centro de Documentação e Pesquisa ...
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Porque agora sabemos que, em primeiro lugar, a experiência<br />
humana e social da <strong>cultura</strong> não correspon<strong>de</strong> exatamente a territó-<br />
rios nacionais e, possivelmente, uma <strong>de</strong> suas maiores gran<strong>de</strong>zas seja<br />
justamente esta possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> permanentemente transpor e trans-<br />
gredir os territórios políticos e nacionais em que a querem encer-<br />
rar. Em segundo lugar, a própria polarida<strong>de</strong> erudito X popular, tão<br />
útil para tantas explicações, na verda<strong>de</strong> dissolve-se na realida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
múltiplas <strong>cultura</strong>s, tantas e tão diferenciadas quantas são as pos-<br />
sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> experiência da vida e <strong>de</strong> significação da vida por par-<br />
te <strong>de</strong> segmentos da vida social brasileira. Primeiro <strong>de</strong>scobrimos -—<br />
sem a ingenuida<strong>de</strong> escolar <strong>de</strong> nossos antecessores — que existem di-<br />
ferenças regionais e, mais importantes do que elas, diferenças étni-<br />
cas, <strong>de</strong> grupos sócio-<strong>cultura</strong>is e <strong>de</strong> subgrupos, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>les. Desco-<br />
brimos uma vez mais, por exemplo, a <strong>cultura</strong> indígena, que, sendo<br />
no Brasil, recusa-se a ser brasileira. Depois re<strong>de</strong>scobrímos as dife-<br />
renças entre <strong>cultura</strong>s gê e <strong>cultura</strong>s tupi. Depois, ainda, re<strong>de</strong>scobrí-<br />
mos a peculiarida<strong>de</strong> da experiência <strong>cultura</strong>l <strong>de</strong> cada grupo especí-<br />
fico, <strong>de</strong> cada tribo. Isto vale mais para os segmentos não-indígenas<br />
<strong>de</strong> nossa socieda<strong>de</strong>. As múltiplas <strong>cultura</strong>s e diferenças <strong>cultura</strong>is dos<br />
povos camponeses e <strong>de</strong>mais povos rurais do país. Aquelas a que da-<br />
mos com freqüência o nome <strong>de</strong> <strong>cultura</strong>s tradicionais. Depois, a nova<br />
e riquíssima experiência <strong>de</strong> <strong>cultura</strong> e <strong>cultura</strong>s que, hoje, são criadas<br />
e recriadas na periferia das cida<strong>de</strong>s. Algo que tem sido cada vez<br />
com mais freqüência estudado entre nós: as <strong>cultura</strong>s dos movimen-<br />
tos sociais, dos movimentos populares. Aquilo que eles acrescentam,<br />
como símbolo e significados, ao repertório <strong>de</strong> nomes e palavras,<br />
mas também <strong>de</strong> gestos e cantos com que contamos para, afinal, sa-<br />
bermos por nós próprios quem somos e o valor do que fazemos.<br />
INTERCOM — Existe uma personalida<strong>de</strong> padrão do brasileiro?<br />
Prof. Carlos R. Brandão — A idéia <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> padrão foi mui-<br />
to comum na sociologia e na psicologia do passado. Hoje em dia<br />
ela tem sido muito posta em questão. O que se sabe — e há inú-<br />
meras investigações <strong>de</strong> psicólogos e antropólogos abordando isto ■—<br />
é que certos padrões básicos <strong>de</strong> relações primárias, entre pais e fi-<br />
lhos, por exemplo, po<strong>de</strong>m constituir certos modos coletivos <strong>de</strong> se ser,<br />
como uma pessoa social. Mas entre isto e a afirmação <strong>de</strong> que exis-<br />
te uma espécie <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> padrão do brasileiro, que o tor-<br />
naria diferente tanto <strong>de</strong> vizinhos, como os argentinos, quanto <strong>de</strong><br />
distantes, como os tailan<strong>de</strong>ses, há uma perigosa distância. Aqui<br />
mesmo no Brasil convivemos com várias e diferentes tendências <strong>de</strong><br />
conduta e <strong>de</strong> compreensão da realida<strong>de</strong>. Seriam várias "personali-<br />
da<strong>de</strong>s <strong>de</strong> brasileiros". Mas a gran<strong>de</strong> questão é que este problema,<br />
sem dúvida alguma tão generosamente fascinante quanto difícil e<br />
controvertido, tem sido mais objeto <strong>de</strong> preconceitos e gratuida<strong>de</strong>s<br />
do que <strong>de</strong> pesquisas <strong>de</strong> fato consistentes. Há, por exemplo, entre<br />
nós, um preconceito bastante difundido contra o carioca. Ele seria<br />
o sujeito pouco dado ao trabalho, amigo <strong>de</strong> praia, cerveja e prazer.<br />
Pois bem, uma séria pesquisa <strong><strong>de</strong>mo</strong>nstrou, faz pouco tempo, que<br />
o operariado carioca possui uma rotina <strong>de</strong> trabalho em nada dife-<br />
rente à do paulista e, sob certos pontos <strong>de</strong> vista, mais fatigante e<br />
produtiva do que a <strong>de</strong> operários norte-americanos e europeus.<br />
Hoje em dia voltamos à questão da "personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> base" com<br />
conceitos e teorias muito mais refinados. Por exemplo, toda a íér-<br />
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