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Os Sertões - Euclides da Cunha - Mkmouse.com.br

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apta<strong>da</strong> por um policial. Foi o desfecho. Fulminado de vergonha, o infeliz<<strong>br</strong> />

procura o recesso dos sertões, paragens desconheci<strong>da</strong>s, onde lhe não saibam<<strong>br</strong> />

o nome; o a<strong>br</strong>igo <strong>da</strong> absoluta obscuri<strong>da</strong>de.<<strong>br</strong> />

Desce para o sul do Ceará.<<strong>br</strong> />

Ao passar em Paus Brancos, na estra<strong>da</strong> do Crato, fere <strong>com</strong> ímpeto de<<strong>br</strong> />

alucinado, à noite, um parente, que o hospe<strong>da</strong>ra. Fazem-se <strong>br</strong>eves inquirições<<strong>br</strong> />

policiais, tolhi<strong>da</strong>s logo pela própria vítima reconhecendo a não culpabili<strong>da</strong>de do<<strong>br</strong> />

agressor. Salva-se <strong>da</strong> prisão. Prossegue depois para o sul, à toa, na direção do<<strong>br</strong> />

Crato. E desaparece...<<strong>br</strong> />

Passam-se dez anos. O moço infeliz de Quixeramobim ficou de todo<<strong>br</strong> />

esquecido. Apenas uma ou outra vez lhe recor<strong>da</strong>vam o nome e o termo<<strong>br</strong> />

escan<strong>da</strong>loso <strong>da</strong> existência, em que era magna pars um Lovelace de coturno<<strong>br</strong> />

reúno, um sargento de polícia.<<strong>br</strong> />

Graças a este incidente, algo ridículo, ficara nas paragens natais <strong>br</strong>eve<<strong>br</strong> />

resquício de sua lem<strong>br</strong>ança.<<strong>br</strong> />

Morrera por assim dizer.<<strong>br</strong> />

Como se faz um monstro<<strong>br</strong> />

... E surgia na Bahia o anacoreta som<strong>br</strong>io, cabelos crescidos até aos<<strong>br</strong> />

om<strong>br</strong>os, barba inculta e longa; face escaveira<strong>da</strong>; olhar fulgurante; monstruoso,<<strong>br</strong> />

dentro de um hábito azul de <strong>br</strong>im americano; abordoado ao clássico bastão em<<strong>br</strong> />

que se apóia o passo tardo dos peregrinos...<<strong>br</strong> />

É desconheci<strong>da</strong> a sua existência durante tão largo período. Um velho<<strong>br</strong> />

caboclo, preso em Canudos nos últimos dias <strong>da</strong> campanha, disse-me algo a<<strong>br</strong> />

respeito, mas vagamente, sem precisar <strong>da</strong>tas, sem pormenores característicos.<<strong>br</strong> />

Conhecera-o nos sertões de Pernambuco, um ou dois anos depois <strong>da</strong> parti<strong>da</strong><<strong>br</strong> />

do Crato. Das palavras desta testemunha, concluí que Antônio Maciel, ain<strong>da</strong><<strong>br</strong> />

moço, já impressionava vivamente a imaginação dos sertanejos. Aparecia por<<strong>br</strong> />

aqueles lugares sem destino fixo, errante. Na<strong>da</strong> referia so<strong>br</strong>e o passado.<<strong>br</strong> />

Praticava em frases <strong>br</strong>eves e raros monossílabos. An<strong>da</strong>va sem rumo certo, de<<strong>br</strong> />

um pouso para outro, indiferente à vi<strong>da</strong> e aos perigos, alimentando-se mal e<<strong>br</strong> />

ocasionalmente, dormindo ao relento à beira dos caminhos, numa penitência<<strong>br</strong> />

demora<strong>da</strong> e rude...<<strong>br</strong> />

Tornou-se logo alguma coisa de fantástico ou mal-assom<strong>br</strong>ado para<<strong>br</strong> />

aquelas gentes simples. Ao abeirar-se <strong>da</strong>s rancharias dos tropeiros aquele<<strong>br</strong> />

velho singular, de pouco mais de trinta anos, fazia que cessassem os<<strong>br</strong> />

improvisos e as violas festivas.<<strong>br</strong> />

Era natural. Ele surdia - esquálido e macerado - dentro do hábito escorrido,<<strong>br</strong> />

sem relevos, mudo, <strong>com</strong>o uma som<strong>br</strong>a, <strong>da</strong>s chapa<strong>da</strong>s povoa<strong>da</strong>s de duendes...<<strong>br</strong> />

Passava, buscando outros lugares, deixando absortos os matutos<<strong>br</strong> />

supersticiosos.

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