13.04.2013 Views

Os Sertões - Euclides da Cunha - Mkmouse.com.br

Os Sertões - Euclides da Cunha - Mkmouse.com.br

Os Sertões - Euclides da Cunha - Mkmouse.com.br

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

E pouco mais especializa quem an<strong>da</strong>, pelos dias claros, por aqueles ermos,<<strong>br</strong> />

entre árvores sem folhas e sem flores. To<strong>da</strong> a flora, <strong>com</strong>o em uma derruba<strong>da</strong>,<<strong>br</strong> />

se mistura em baralhamento indescritível. É a catanduva, mato doente, <strong>da</strong><<strong>br</strong> />

etimologia indígena, dolorosamente caí<strong>da</strong> so<strong>br</strong>e o seu terrível leito de espinhos<<strong>br</strong> />

!<<strong>br</strong> />

Vingado um cômoro qualquer, postas em torno as vistas, perturba-as o<<strong>br</strong> />

mesmo cenário desolador: a vegetação agonizante, doente e informe, exausta,<<strong>br</strong> />

num espasmo doloroso...<<strong>br</strong> />

É a sylva oestu aphylla, a sylva borri<strong>da</strong>, de Martius, a<strong>br</strong>indo no seio<<strong>br</strong> />

iluminado <strong>da</strong> natureza tropical um vácuo de deserto.<<strong>br</strong> />

Compreende-se, então, a ver<strong>da</strong>de <strong>da</strong> frase paradoxal, de Aug. de Saint-<<strong>br</strong> />

Hilaire: "Há, ali, to<strong>da</strong> a melancolia dos invernos, <strong>com</strong> um sol ardente e os<<strong>br</strong> />

ardores do verão!"<<strong>br</strong> />

A luz crua dos dias longos flameja so<strong>br</strong>e a terra imóvel e não a anima.<<strong>br</strong> />

Reverberam as infiltrações de quartzo pelos cerros calcários,<<strong>br</strong> />

desordena<strong>da</strong>mente esparsos pelos ermos, num alvejar de banquises; e,<<strong>br</strong> />

oscilando à ponta dos ramos secos <strong>da</strong>s árvores inteiriça<strong>da</strong>s, dependuram-se as<<strong>br</strong> />

tilândsias alvacentas, lem<strong>br</strong>ando flocos esgarçados, de neve, <strong>da</strong>ndo ao<<strong>br</strong> />

conjunto o aspecto de uma paisagem glacial de vegetação hibernante, nos<<strong>br</strong> />

gelos . . .<<strong>br</strong> />

A tormenta<<strong>br</strong> />

Mas no empardecer de uma tarde qualquer, de março, rápi<strong>da</strong>s tardes sem<<strong>br</strong> />

crepúsculos, prestes afoga<strong>da</strong>s na noite, as estrelas pela primeira vez cintilam<<strong>br</strong> />

vivamente.<<strong>br</strong> />

Nuvens volumosas abarreiram ao longe os horizontes, recortando-os em<<strong>br</strong> />

relevos imponentes de montanhas negras.<<strong>br</strong> />

Sobem vagarosamente; incham, bolhando em lentos e desmesurados<<strong>br</strong> />

rebojos, na altura; enquanto os ventos tumultuam nos plainos, sacudindo e<<strong>br</strong> />

retorcendo as galha<strong>da</strong>s.<<strong>br</strong> />

Em<strong>br</strong>uscado em minutos, o firmamento golpeia-se de relâmpagos<<strong>br</strong> />

precípites, sucessivos, sarjando fun<strong>da</strong>mente a imprimadura negra <strong>da</strong> tormenta.<<strong>br</strong> />

Reboam ruidosamente as trovoa<strong>da</strong>s fortes. As bátegas de chuva tombam<<strong>br</strong> />

grossas, espaça<strong>da</strong>mente, so<strong>br</strong>e o chão, adunando-se logo em aguaceiro<<strong>br</strong> />

diluviano...<<strong>br</strong> />

Ressurreição <strong>da</strong> flora<<strong>br</strong> />

E ao tornar <strong>da</strong> travessia o viajante, pasmo, não vê mais o deserto.<<strong>br</strong> />

So<strong>br</strong>e o solo, que as amarílis atapetam, ressurge triunfalmente a flora<<strong>br</strong> />

tropical.<<strong>br</strong> />

É uma mutação de apoteose.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!