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Elogio da Loucura - CFH

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papas — Estamos defendendo apostolicamente a causa <strong>da</strong> Igreja e só deporemos as armas<br />

quando tivermos vingado a esposa de Jesus Cristo contra os seus inimigos. — Eu desejaria<br />

saber, porém, se haverá para a Igreja inimigos mais perniciosos do que esses ímpios<br />

pontífices, os quais, em lugar de pregar Jesus Cristo, deixam no esquecimento o seu nome e<br />

o põem de lado com leis lucrativas, alteram a sua doutrina com interpretações força<strong>da</strong>s e,<br />

finalmente, o destroem com exemplos pestilentos.<br />

Além disso, assim como a Igreja cristã foi fun<strong>da</strong><strong>da</strong> com sangue, confirma<strong>da</strong> com<br />

sangue, dilata<strong>da</strong> com sangue, assim também os papas a governam com sangue, como se<br />

nunca Jesus Cristo tivesse existido para protegê-la e sustentá-la. A guerra é, por natureza,<br />

tão cruel, que muito mais conviria às feras do que aos homens; tão insensata que os poetas a<br />

atribuíram às fúrias do inferno; tão pestilenta que corrompe todos os costumes; tão iníqua<br />

que a fazem melhor perversos ladrões do que homens probos e virtuosos; finalmente, tão<br />

ímpia que nenhuma relação possui com Jesus Cristo nem com sua moral. Isso não impede<br />

que alguns pontífices abandonem to<strong>da</strong>s as funções pastorais para consagrar-se inteiramente<br />

a esse flagelo <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de. Entre esses papas guerreiros, encontram-se até velhos (97)<br />

que agem com todo o vigor <strong>da</strong> juventude, que nenhuma consideração têm pelo dinheiro,<br />

que suportam corajosamente a fadiga e não têm o menor escrúpulo em fazer subverter as<br />

leis, a religião e a humani<strong>da</strong>de. Mas, não faltam eruditos aduladores para <strong>da</strong>r a esse<br />

manifestíssimo delírio o nome de zelo, pie<strong>da</strong>de, valor. E acham razões para provar que<br />

desembainhar a espa<strong>da</strong> e cravá-la no coração de um irmão não é absolutamente infringir o<br />

grande man<strong>da</strong>mento <strong>da</strong> cari<strong>da</strong>de para com o próximo. Na ver<strong>da</strong>de, ain<strong>da</strong> não sei se os<br />

papas, em matéria de guerra, seguiram o exemplo de alguns bispos <strong>da</strong> Alemanha, ou se<br />

estes bispos é que se julgaram autorizados, pela conduta dos papas, a empreender a guerra.<br />

O que é certo é que os prelados alemães agem com maior liber<strong>da</strong>de, porque, desprezando<br />

inteiramente o serviço divino, as bênçãos e to<strong>da</strong>s as outras cerimônias do bispado, como<br />

ver<strong>da</strong>deiros sátrapas só respiram a guerra, chegando a sustentar que é dever de um bispo<br />

entregar a alma a Deus para defender a honra <strong>da</strong> sua digni<strong>da</strong>de. Os padres também estão,<br />

em geral, animados pelo mesmo espírito, não querendo de modo algum degenerar <strong>da</strong><br />

santi<strong>da</strong>de dos prelados. Assim, não podeis imaginar com que coragem empunham as armas<br />

to<strong>da</strong> a vez que se trata dos seus dízimos: espa<strong>da</strong>s, fuzis, pedras, na<strong>da</strong> lhes escapa. Esses<br />

ministros do altar não cabem em si de alegria quando descobrem, nas obras dos antigos,<br />

alguma passagem com que possam aterrar as consciências e provar ao vulgo que lhes deve<br />

ain<strong>da</strong> muito mais do que os dízimos. Não há mais perigo de que lhes entre na cabeça o que<br />

leram em muitíssimos lugares sobre os seus deveres para com o povo. Deveriam ao menos<br />

lembrar-se de que a tonsura significa a obrigação de viverem livres de qualquer paixão<br />

humana, para se consagrarem totalmente às coisas do céu. Muito longe de fazerem tais<br />

reflexões, incidem em to<strong>da</strong> sorte de volúpia e julgam cumprir plenamente os seus deveres e<br />

as obrigação de praticar o bem, como dizem eles, quando murmuram, às pressas e entre os<br />

dentes, o ofício divino. Santo Deus! aposto que não há nenhuma divin<strong>da</strong>de que queira<br />

escutá-los e, muito menos, que possa compeendê-los. Nenhuma divin<strong>da</strong>de?! Estou<br />

convenci<strong>da</strong> de que nem eles próprios se entendem entre si quando ornejam em coro. Mas,<br />

tanto os sacerdotes como os profanos sabem muito bem quais são os seus direitos e os seus<br />

emolumentos. Sabe-se mesmo, pelas mulheres, que quem serve o altar deve viver do altar.<br />

O que é incômodo os senhores padres costumam, prudentemente, descarregar sobre as<br />

costas alheias, numa devolução recíproca, como na péla. Os eclesiásticos costumam<br />

proceder mais ou menos como os príncipes seculares: assim como estes abandonam as<br />

rédeas do governo nas mãos dos primeiros ministros, que confiam a administração do

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