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nada sobre isso, em certo sentido, a não ser aceitar esperando, e observando<br />
como alguns de nós são massacrados ou ficam loucos no meio do<br />
caminho. (Jacques Rivette, em seu belo filme Paris nos pertence [Paris<br />
nous appartient, 1958], que vocês verão nesta temporada no Cinema<br />
16, mostra que o mesmo está acontecendo na França: ele está em todo<br />
lugar, esse terror sem nome.)<br />
Alguns de nós tentam fazer alguma coisa. Mas acabamos fazendo<br />
mais bombas ou protestando contra elas. Contudo, quando estamos<br />
sentados sozinhos, e pensamos em silêncio, não sabemos de fato por<br />
que fazemos isso ou aquilo, ou contra o que e a favor do que estamos<br />
exatamente, ou qual é a verdadeira causa. Ainda assim, temos que fazer.<br />
Então, – onde eu estava mesmo? – esse filme (assim como a peça),<br />
essa nova arte sofredora e temperamental, não é de fato uma previsão<br />
do desastre, mas um sinal jubiloso de que existe um profundo desespero<br />
se processando em algum lugar dentro de nós – um sinal de que<br />
nem tudo é tão climatizado (como costumávamos dizer) e morto no<br />
homem –, que está aí para que saibamos que quanto mais profundo é o<br />
nosso desespero, mais perto ficamos da verdade, e da saída. Logo, The<br />
Connection – como a maioria da nova arte “niilista”, “dadaísta”, “escapista”,<br />
etc. – é uma arte positiva, que não mente, falseia ou finge sobre<br />
nós mesmos. Ela vai além da arte naturalista, pragmática e superficial,<br />
e mostra algo da essência.<br />
Nem todos estão prontos para ouvir ou sentir o que The Connection<br />
está dizendo, para ter a experiência do que o filme é – nem nós sabemos<br />
exatamente do que ele trata realmente. Cada um de nós se aterá a coisas<br />
diferentes nele. Esse filme, que é, em sua superfície, sobre nada, não<br />
apresenta nenhuma ideia, lida mais com o absurdo do que com o sentido,<br />
e não tem nenhuma ação ou drama particular; é um filme que sugere,<br />
intui as verdadeiras ideias, a verdadeira ação e o verdadeiro sentido.<br />
Existem muitas outras formas de dizer algo sobre os homens. Pode<br />
ser também verdade que The Connection não seja cinema puro (como<br />
não foi teatro puro) ou que seria mais bem filmado no Harlem, etc., etc.,<br />
mas isso tem pouco a ver com o que estou falando. E tampouco é de importância<br />
essencial. É através da variedade de formas artísticas e objetos<br />
artísticos – ambos perfeitos e imperfeitos – que a totalidade da exis-<br />
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