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ideia do cinema ideal. Mas, como tal retorno ao lar prejudica a posição<br />
da verdadeira Lituânia no mito de sua própria vida, é preciso também<br />
que este seja problemático; e, assim, na seção seguinte, acompanhando<br />
imagens de imigrantes lituanos envolvidos numa dança folclórica, ele<br />
relata seus vários medos mórbidos e o fato de não mais se lembrar de<br />
seus sonhos, perguntando então, “Será que estou perdendo tudo aquilo<br />
que trouxe comigo de fora?”, cortando então para uma sombria canção<br />
folclórica lituana. A justaposição dos traços da Lituânia da infância com<br />
a forma ideal de sua recriação é a crise do filme; esta é resolvida pela aceitação<br />
da compensação da perfeição da vida cotidiana – inclusive da vida<br />
no Novo Mundo – e da comunidade de cineastas independentes. Assim,<br />
na terceira seção, ele retorna a Nova York, ao ambiente do Novo Cinema<br />
Americano, reconhecendo-o como Walden nos termos que já exploramos.<br />
Ao descobrir seu lar no cinema, ele descobre uma América na reencenação<br />
individual da origem do país. 35 Mas não completamente; ele<br />
também preserva seu isolamento, rejeitando finalmente a assimilação<br />
total a esta comunidade e o tipo de filme que ele começou a fazer.<br />
No último movimento do filme, depois de voltar da casa dos<br />
Brakhage, ele esclarece sua própria prática como uma percepção pessoal.<br />
Mas esta é definida nem tanto contra Hollywood nem quanto contra<br />
a vanguarda, que agora é revelada como degradada, pois tornou-se<br />
comercial e sensacionalista. O tema contrário é dramatizado numa sequência<br />
longa em que Adolfas dirige cenas de seu filme, Hallelujah the<br />
Hills, para o proveito de uma equipe alemã de TV que faz um documentário<br />
sobre o cinema underground. É também articulado discursivamente<br />
numa narração em que, destacando a ausência de drama ou suspense<br />
em suas imagens, <strong>Mekas</strong> afirma que estas são “apenas imagens<br />
para mim e alguns outros. Não é preciso assisti-las, mas, quem quiser<br />
fazê-lo, pode”. Esta rejeição do objeto orgânico da arte em benefício do<br />
35 Novamente estou lendo <strong>Mekas</strong> por meio de Cavell, que destaca a mudança de Thoreau para<br />
Walden no feriado da independência: “Sabemos o dia específico do ano específico no qual todos os<br />
ancestrais da Nova Inglaterra fizeram seu abrigo na floresta. Aquele momento de origem é o evento<br />
nacional reencenado nos eventos de Walden, desta vez com o objetivo de fazê-lo da maneira correta<br />
ou provar que é impossível; de descobrir e se instalar nesta terra, ou a questão desta terra, de uma vez<br />
por todas” (1972, p. 8).