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Volume 3 - Jonas Mekas - Via: Ed. Alápis

Jonas Mekas

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po suspende seu voo a fim de inscrever no coração do filme a cesura da<br />

morte (como o havia feito Notes for Jerome, dividido também por um<br />

antes e um depois da morte do amigo, e no qual <strong>Mekas</strong> revisita alguns<br />

anos depois a casa desertificada de Cassis, que então ecoava o Lamento<br />

d ’Ariana do mesmo compositor). Coisa rara em um cineasta que prefere,<br />

para intensificar a vida, a velocidade da aceleração ou do imagem<br />

por imagem, <strong>Mekas</strong> filma em câmera lenta, no momento do funeral de<br />

Maciunas em 11 de maio de 1978, o reencontro de seus companheiros<br />

na esplanada que os leva ao Fresh Pond Crematorium no Queens, logo<br />

antes que sua câmera se perca na brancura ressuscitada de uma cerejeira<br />

em flor, no próprio diapasão das palavras do madrigal que ele oferece<br />

então aos nossos ouvidos e leitura serenados.<br />

Durante a cerimônia, em uma homenagem feita a seu filho, Leokadija<br />

menciona algumas das palavras de George na véspera de sua morte:<br />

“Por enquanto, me contento com música e plantas”. Ele sonhava igualmente,<br />

nos diz <strong>Mekas</strong> em seu filme, com “gotas de chuva sobre o capim”.<br />

Monteverdi, que gostava de brincar com o significado de seu nome<br />

(monte verde), já solicitava a ajuda de seus protetores para que “a pequena<br />

montanha de [s]eu gênio se tornasse cada dia mais verde”, ao mesmo<br />

tempo em que fingia acreditar que era “uma planta verde, mas de uma<br />

natureza que só produz folhagem e flores sem odor”. O próprio <strong>Mekas</strong>,<br />

imarcescível filho de camponeses, não pode viver sem verde, o da grama<br />

e das árvores, dos parques e dos campos. O verde sobe à superfície de sua<br />

obra inteira, por mais underground que ela seja, ao ponto de virar uma<br />

coda sensual quando, ao fim de Sleepless Night Stories (2011), na aurora<br />

destas mil e uma noites citadinas, betuminosas e alcoolizadas, ele consegue<br />

torná-lo não apenas visível e audível mas quase tátil e odorante.<br />

Só lhe resta se embrenhar neste verde totalmente, da cabeça aos pés.<br />

Evitemos, pois, ver nessas cenas da vida de George Maciunas (assim<br />

como naquelas de Jerome Hill, de Andy Warhol, de John Lennon<br />

ou de Allen Ginsberg) um epitáfio, uma oração fúnebre, uma lição das<br />

trevas ou um túmulo, ainda que poético (como foram no cinema, em<br />

diferentes graus, Três canções para Lênin [Tri pesni o Lenine], de Dziga<br />

Vertov, O túmulo de Alexandre/Elegia para Alexandre [Le Tombeau<br />

d ’Alexandre], de Chris Marker, ou História(s) do Cinema [Histoire(s) du

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