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Volume 3 - Jonas Mekas - Via: Ed. Alápis

Jonas Mekas

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Assumindo o manto de poeta, ele cita a Autobiografia de William<br />

Carlos Williams, segundo a qual “o negócio do poeta... (é) no particular<br />

descobrir o universal”. Como que retornando ao seu próprio mito das<br />

origens poéticas, ele faz do texto do diário de 1960 lido no capítulo 4<br />

uma legenda em cartão, “Ele se senta sob uma árvore no parque escutando<br />

as folhas”, para introduzir quatro cenas de uma árvore, continuamente<br />

mudando a exposição do tronco para capturar “o que vi naquela<br />

árvore enquanto olhava.” Desta vez, mais do que capturar o vento na<br />

árvore ou sua energia, a filmagem de <strong>Mekas</strong> revela a textura e a solidez<br />

do tronco, suas macias folhas e seu apetite por luz, como se ela, como<br />

Hollis dando à luz, fosse o ponto de conexão entre terra e céu (paraíso).<br />

A segunda metade de As I Moved Ahead se esforça para evitar o subtexto<br />

de melancolia dos capítulos iniciais, mas é apenas no oitavo capítulo<br />

que a ameaça de uma recaída se torna explícita. Apesar de rejeitar<br />

firmemente categorias psicanalíticas, ele quase chega a oferecer uma teoria<br />

da repressão na crise do capítulo 8. A crucial passagem com voz over<br />

começa com a única alegação sem reservas de autorreflexão em todo o<br />

filme: “Enquanto monto estes pedaços de filme, tarde da noite, estou<br />

pensando em mim mesmo”. Então ele admite seu descontentamento:<br />

“Eu me cobri com camadas de civilização, tantas camadas que agora eu<br />

mesmo não vejo quão facilmente as feridas são feitas lá no fundo... Não<br />

sei nada. Mas continuo indo em frente, indo em frente, devagar, e alguns<br />

vislumbres de felicidade e beleza aparecem no meu caminho”.<br />

A profundidade e invisibilidade das feridas tornam os inesperados<br />

vislumbres de felicidade possíveis e visíveis. A repressão mais explícita<br />

em seu modo de fazer filmes é a um plano ou projeto. A compensação<br />

por reprimir o esquema geral é o êxtase de filmar. Filmar, como<br />

ele o faz, até mesmo separa acontecimentos e pessoas de seus planos<br />

e propósitos, transportando-os ao momento extático sem passado ou<br />

futuro que ele sublima como “fragmentos de paraíso”. Em sua fala no<br />

começo do quarto capítulo, <strong>Mekas</strong> havia dito: “Não gosto de suspense”.<br />

Suspense no cinema é o modo dominante de sujeição do acontecimento<br />

extático, fragmentado, a um plano e a um propósito cujo momento é<br />

provocadoramente atrasado. Sob a pressão desse adiamento, o encontro<br />

entre o filmador e o mundo diante dele perde seu caráter extático. Êx-

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