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Untitled - Grumo

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[1 0 7<br />

tui a identidade brasileira a partir da assimilação da força da cultura domi-<br />

nante (européia). Mas a institucionalização da antropofagia na cultura<br />

brasileira fez com que ela se transformasse em "dominante", em conceito<br />

"universal", no sentido da eliminação de diferenças internas. Glauco Mattoso<br />

e Roberto Piva desconstroem essa identidade nacional, mostrando a diversi-<br />

dade do particular. Assim, a cultura já não pode ser vista como resolução de<br />

conflitos, 11 mas como exposição deles. No entanto, o conflito exposto nestes<br />

poetas não é simplesmente o da homossexualidade como identidade margin-<br />

alizada no conceito universal de cultura nacional; pelo contrário, minha<br />

hipótese é que nos seus textos o homoerotismo não constitui uma identidade<br />

homossexual, mas afirma uma excentricidade. 12<br />

Glauco escreve, no Jornal Dobrábil, vários manifestos paródicos (o Jornal é,<br />

de fato, uma "máquina pop" de produzir e re-produzir manifestos, que se<br />

diferencia da máquina warholiana por produzir lixo do luxo e não ao con-<br />

trário). O "Manifesto Coprofágico" 13 e o "Manifesto Vanguardada" 14 são<br />

releituras do modernismo, "parodiando a revista de Antropofagia" 15 (como<br />

declara o jornal), mas ao mesmo tempo homenageándo-a. Essas releituras<br />

estão mediadas pelo concretismo, cuja presença é perfeitamente perceptível<br />

na construção visual da página através dos desenhos feitos com a tipografia.<br />

E não por acaso o nome da folha faz referência ao Jornal do Brasil, pois este<br />

tinha uma estreita ligação com a poesia concreta. De fato, é justamente no<br />

JB onde foram divulgados o "Manifesto Concreto", o "Plano Piloto para a<br />

Poesia Concreta", e o "Manifesto Neoconcreto".<br />

O "Manifesto Coprofágico" está assinado por um dos heter-homo-nimos de<br />

Glauco, Pedro o Podre, que assume as passagens mais abjetas no jornal. (Aqui<br />

D o s s i e r<br />

me permito abrir um parêntese, para falar dos heterônimos. Glauco Mattoso,<br />

que é ja um pseudónimo, tem outros no jornal: Louco Mattoso, Glauco<br />

Espermattoso, e até o próprio Pedro o Podre "herterônimo do psedudôni-<br />

mo"tem outros tantos heter-homo-nimos: Pietro il Pútrido, Peter the<br />

Rotten, Pierre le Pourri, Pedlo Glande). Esse manifesto é uma reciclagem do<br />

antropófago, em chave escatológica: se a antropofagia propunha "devorar"<br />

seletivamente os produtos da cultura colonizadora e convertê-los em ele-<br />

mentos de uma cultura que supere a anterior, Glauco incorpora os elemen-<br />

tos da cultura dominante, mas para convertê-los em defeitos. Assim, o<br />

processo de abjeção dessacraliza a cultura, sacralizando o abjeto, como na iro-<br />

nia que Glauco faz do verso de Garcia Lorca "verde que te quiero verde...":<br />

"mierda que te quiero mierda" diz Glauco, e tira sutilmente uma letra na assi-<br />

natura apócrifa, que fica: "Garcia Loca". Mas essa dessacralização/sacraliza-<br />

ção da arte, diz também respeito à sociedade, ao mito do progresso e do<br />

Brasil cosmopolita:<br />

merda comunitária, cosmopolita e clandestina,<br />

merda métrica palindrômica alexandrina<br />

(...) tu es meu continente terra fecunda onde germina<br />

minha independência minha indisciplina.<br />

A noção de reciclagem é central no JD, cheio de citações falsas, plágios e ree-<br />

scrituras que deslocam a subjetividade. Nesse caos de heterônimos e citações<br />

falsas, não há, é óbvio, possibilidade nenhuma de pensar um sujeito. Este<br />

excesso é o reverso do minimalismo concreto, mas ambos levam à descon

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