Untitled - Grumo
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Pedólatra Amador, ed. Ex p ressão, radicalizou o fetiche da pedolatria.<br />
Escreveu ainda ensaios (O que é Poesia Marginal e O que é Tortura — ambos<br />
da coleção Pr i m e i ros Passos, da editora Brasiliense), quadrinhos (As<br />
Aventuras de Glaucomix, o Pedólatra, ed. Abriu Fechou) e letras de música,<br />
gravadas pelo cantor/compositor Edvaldo Santana e pelas bandas punks Billy<br />
Brothers, Baratas Tontas e T.I.T, entre outras.<br />
Nesta entrevista, gravada num domingo de junho de 1988, ele teoriza sobre<br />
as origens de suas tramóias transgressivas, fala da relação de sua obra com a<br />
contracultura e se revela um criador/intelectual na tradição dos grandes<br />
satíricos e humoristas.<br />
Na época deste nosso encontro, Glauco não escrevia mais quase nada.<br />
Parecia estar ainda sob o impacto da cegueira que o atingira três anos antes,<br />
resultado de um glaucoma congênito. De lá para cá, no entanto, voltou a<br />
escrever furiosamente, publicando quatro novos livros (todos de sonetos —<br />
com sua costumeira linguagem virulenta) em um curto período de 2 anos:<br />
Centopéia (1999), Paulisséia Ilhada (1999), Geléia de Rococó (1999 – os três<br />
pela editora Ciência do Acidente) e Panacéia (2000 – pela Nankin Editorial).<br />
Esta entrevista foi publicada originalmente na re v i s t a<br />
brasileira Medusa nº 1 (novembro de 1998).<br />
No livro O Seqüestro do Barroco, Haroldo de Campos relembra que a<br />
literatura brasileira começa com Gregório de Matos. E grande parte da<br />
obra de Gregório está marcada pela sacanagem, pelo erotismo, pela críti-<br />
ca de costumes. Quer dizer, a literatura brasileira já começa com ênfase<br />
D o s s i e r<br />
nesse tipo de temática. Isso aparece também na tua obra. Gregório de<br />
Matos é uma referência importante no teu trabalho?<br />
Glauco Mattoso — É. Ele se insere naquilo que o José Paulo Paes<br />
chama de "veio subterrâneo" da literatura. José Paulo Paes é um grande cul-<br />
tor desse gênero. Ele traduziu poesia erótica de várias fontes e inclusive me<br />
forneceu subsídios na época que eu estava iniciando minhas pesquisas nesse<br />
campo. Se você considerar que, antes de Gregório, já na carta de Caminha<br />
havia sacanagem (aquela estória de ressaltar o erotismo das índias)...<br />
As suas vergonhas expostas, saradinhas e limpas das cabeleiras...<br />
Glauco — Exatamente. A literatura brasileira já começou com<br />
sacanagem. Talvez porque o Brasil seja um país para onde se mandavam os<br />
degredados. Aquelas pessoas que não estavam muito bem encaixadas na<br />
sociedade, que tinham algum tipo de delito na sua biografia, eram mandadas<br />
pra cá. Aqui era um paraíso onde valia tudo. Agora, além de Gregório de<br />
Matos, nós temos todo um fio condutor desse tipo de literatura, que remon-<br />
ta ao fescenino, aos epigramas de Marcial, remonta à Idade Média — existe<br />
toda uma tradição. A sacanagem parece algo inconseqüente, mas na verdade<br />
ela é clássica — talvez a coisa mais clássica que existe em literatura. Ela sobre-<br />
vive a todo tipo de censura. Os pólos literários flutuam ao sabor de alterações<br />
históricas, econômicas, políticas, mas a sacanagem parece ter durado porque<br />
ela fica sempre à margem de qualquer establishment. Então, o que eu faço...<br />
na verdade a motivação disso tudo é que me formei bibliotecário. Na época<br />
estávamos no auge do AI-5 (nota: Ato Institucional nº 5, que fechou o<br />
Congresso Nacional, instaurou a censura prévia e intensificou a repressão<br />
política pela ditadura military no Brasil). Havia um Index Librorum