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Um monstro no ninho<br />
com sua mãe e avó, ou o anúncio de um futuro restrito, já que terá que trabalhar,<br />
ao invés de estudar, e trocar sua vida social por noites de fraldas e mamadeiras.<br />
Pode ser a forma de livrar-se de uma mãe que não deixa a filha crescer, oferecendo-lhe<br />
um neto e deixando-o no seu lugar. Pode ser um meio de união com o<br />
homem amado, o sinal de que o casal quer construir algo junto, ou o início de uma<br />
seqüência de abandonos masculinos, nos quais a mulher sempre se encontra<br />
enfim só, criando o filho e ruminando seus sonhos frustrados de família feliz.<br />
Engravidar é um acontecimento feminino de múltiplos significados, e boa<br />
parte deles não contém a intenção genuína de ser mãe. O fato de que um<br />
deslize psicológico ou biológico (do casal) tenha redundado numa gravidez não<br />
planejada não deve impor uma maternidade compulsória. Se em muitos lugares,<br />
legalmente, o aborto é considerado um crime contra a vida, talvez seja mais<br />
criminoso impedir que a mulher faça essa escolha em seu destino.<br />
Nos debates sobre a legalização do aborto, além dos dilemas éticos<br />
sobre quando começa a vida e quem tem direito sobre ela, fica omitido um fato:<br />
não conseguimos realmente dar vida a um filho que não desejamos. Somos<br />
pouco magnânimos, incapazes de um amor que não nos venha a calhar. Queiramos<br />
ou não, é assim que as coisas acontecem.<br />
O desejo por um filho também não é de uma só maneira, ele pode ter<br />
inúmeras conjugações e todas elas funcionam de alguma forma. Há ocasiões<br />
em que o filho nasce cedo demais, ou tarde demais, que é fruto de uma relação<br />
muito jovem, ou ainda, que já acabou, conseqüência da vontade de um, mas<br />
não do outro. Enfim, variações que demonstram que querer um filho é algo que<br />
pode ser escrito por linhas tortas, e em geral o é. O que essas histórias têm em<br />
comum é que alguém envolvido no acontecimento de uma gravidez, de alguma<br />
forma, está disposto a bancá-la. Quando há escolha, torna-se mais responsável<br />
a relação com cada gestação mantida. O direito à contracepção, assim como à<br />
interrupção voluntária da gravidez, parecem colocar as coisas num terreno de<br />
melhor prognóstico, já que tenderiam a nascer os que foram de algum modo<br />
desejados, aqueles para os quais há energia e condições psíquicas disponíveis.<br />
Porém, a concepção é ainda mais complicada do que parece. A partir de<br />
sua experiência de entrevistas, realizadas na França, por exigência legal, como<br />
parte do processo de interrupções voluntárias da gravidez, a psicanalista Marie-<br />
Magdeleine Chatel (1995) escreveu sobre a necessidade de pensar qualquer<br />
gestação como significativa. Nesse trabalho, ela constatou que, mesmo entre<br />
as mulheres firmemente determinadas a abortar, surge sempre uma fala reveladora<br />
de que o momento da concepção foi peculiar, sintomático. Apesar das racionalizações<br />
necessárias para sustentar a decisão de interrompê-la, essa autora<br />
enfoca que é sempre importante tentar alguma elaboração sobre como foi que<br />
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