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Luciane Loss Jardim<br />
O México é um país muito antigo em termos de civilização; remonta às<br />
culturas maia e asteca, para citar as mais conhecidas. Encontramos resquícios,<br />
não somente arqueológicos, dessas civilizações no dia-a-dia mexicano, representado,<br />
por exemplo, em sua culinária. A inscrição da língua de Cervantes<br />
em território mexicano é muito peculiar. Quando Cortés chegou ao México, chamado<br />
primeiramente de Nova Espanha, o espanhol se impôs. Entretanto, ainda<br />
hoje encontramos o substrato náhuatl, língua falada pelo povo asteca, em toda<br />
uma série de palavras que são próprias do espanhol mexicano, ou seja, que não<br />
são faladas em outros países de idioma espanhol. Inclusive na época da conquista<br />
do México pelos espanhóis, os missionários perceberam a necessidade<br />
de aprender o náhuatl para doutriná-los, pois era impossível o apostolado efetivo<br />
sem o conhecimento das línguas indígenas (Ricard, 1986). Portanto, podemos<br />
afirmar que a cepa, o substrato náhuatl sobreviveu e está presente nos dias de<br />
hoje na língua falada pelo povo mexicano.<br />
Outra herança dos povos que habitavam aquele território e é muito presente<br />
no México ainda hoje são os rituais, basicamente rituais religiosos. Nesse<br />
aspecto, verifica-se uma situação sui generis, pois encontramos uma mistura<br />
de tradições, a indígena e a tradição católica espanhola. O velho e o novo se<br />
conjugam e se entrelaçam nessa cultura. O povo mexicano é um povo de rituais<br />
e que ama as festas e as reuniões públicas. A arte da festa perdida em muitos<br />
povos é reencontrada no México, e seu povo a conserva intacta. Em poucos<br />
lugares do mundo se pode viver um espetáculo como as grandes festas religiosas<br />
no México, festas com muitas cores vibrantes, danças rituais, músicas,<br />
cerimônias e inesgotável variedade de doces, frutas e objetos de artesanato que<br />
se vendem nesses dias, nas praças e mercados das cidades.<br />
As duas principais festas religiosas mexicanas são o día de los muertos,<br />
que é o dia dos finados celebrado nos países católicos, e o dia 12 de dezembro,<br />
que é o dia da padroeira mexicana, La Virgen de Guadalupe. Nessas festas,<br />
como disse Paz, eminente escritor mexicano, “o tempo deixa de ser sucessão<br />
e volta a ser o que foi, e é, ordinariamente: um presente no qual passado e futuro<br />
finalmente se reconciliam” (Paz, 2004, p. 183).<br />
Tal reconciliação é marcada por rituais que demandavam e demandam do<br />
seu povo sacrifícios. Se outrora, nas civilizações antigas do México, os sacrifícios<br />
eram literalmente sangrentos, carnais, dilaceradores de vidas e corpos,<br />
hoje, sem dúvida são menos sangrentos, mas nem por isso menos sacrificais.<br />
No universo religioso da Mesoamérica pré-colombiana, os rituais sacrificais tinham<br />
papel fundamental. A finalidade do sacrifício era oferecer um dom aos<br />
deuses. Sob a ótica desses povos, a oferenda mais apreciada era o sangue,<br />
considerado uma linfa vital e regeneradora. Segundo depoimentos arqueológi-