14.04.2013 Views

Revista n.° 34 - APPOA

Revista n.° 34 - APPOA

Revista n.° 34 - APPOA

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Transferência e angústia...<br />

pagos. Fazer esses sujeitos falarem é, sem dúvida, uma tarefa árdua; porém, a<br />

única alternativa para o resgate subjetivo. Nesses tratamentos, a escuta apresenta<br />

a ancoragem necessária para a realização de novas escolhas.<br />

O pedido de tratamento não é formulado de forma direta. Esse necessita,<br />

geralmente, que alguém o decifre a partir dos comportamentos. O abandono de<br />

atividades cotidianas surge em alguns casos como a impulsão ao tratamento.<br />

Outros, ainda, precisam cavoucar um olhar de preocupação através de corpos<br />

quase mutilados.<br />

Esse pedido constitui o primeiro tempo da demanda. Os sujeitos chegam<br />

ao tratamento aparentemente sem terem outra coisa a dizer, a não ser suas<br />

peripécias com as drogas. É o primeiro tempo de um endereçamento<br />

transferencial, no qual esses sujeitos parecem testar a capacidade do analista<br />

de suportar a escuta das questões tóxicas; “palavras tóxicas”, diz Le Poulichet<br />

(1990), ao analisar a dimensão de passagem ao ato que as palavras podem ter,<br />

destruindo, assim, a possibilidade do après-coup do dizer. Palavras tóxicas,<br />

que passam para o analista a função de “segurar” a angústia.<br />

Assim, os sujeitos tendem a apresentar-se colocando o analista numa<br />

posição que o leva a perguntar-se pela possibilidade de realização da análise.<br />

Rassial (1999), ao falar sobre os momentos iniciais de análise com adolescentes,<br />

lembra-nos que o sujeito tentará pôr o analista numa posição que interditaria<br />

a análise ou a levaria ao fracasso, através das reações terapêuticas negativas.<br />

Suportar esse primeiro tempo da transferência, no qual o analista ocupa<br />

um lugar de objeto imaginário, que desperta o ódio, o amor, a fascinação ou a<br />

angústia (Le Poulichet, 1990), torna-se essencial para a simbolização da demanda<br />

e da transferência; isto é, para que o analista possa ser situado num<br />

lugar de endereçamento da palavra não-tóxica.<br />

Quando dizemos suportar esse primeiro momento da demanda e da transferência,<br />

situamo-nos numa posição contrária à daqueles autores que afirmam<br />

estar o analista num primeiro momento substituindo a droga (Bergeret; Leblanc,<br />

1991; Bucher,1992). Substituir a droga seria engajar-se numa relação dual com<br />

o sujeito, e essa não é, nem no primeiro tempo do tratamento, a posição do<br />

analista. Pelo contrário, seu olhar dirige-se sempre à possibilidade de “irrealizar<br />

o uso da droga no marco da cura” (Le Poulichet, 1990). Caso contrário, colocarnos-íamos<br />

numa posição de competição com o tóxico e, competindo por um<br />

único espaço, não permitiríamos ao sujeito falar, não permitiríamos a criação de<br />

um espaço intermediário. Repetiríamos a dualidade a que os sujeitos nos empurram<br />

constantemente, e cairíamos no engodo por eles proposto, de estabelecer<br />

relações sem mediação.<br />

147

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!