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Revista n.° 34 - APPOA

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Ester Trevisan<br />

fortemente marcado, numa estrutura em que o discurso da medicina e o discurso<br />

da ciência se conjugam e são regidos por uma demanda social de normalização<br />

e controle. A demanda de saber sobre a saúde é colocada em permanência<br />

para aqueles que operam nas instituições de saúde: como ser saudável, como<br />

criar os filhos, o que comer, o quanto engordar, como retardar o envelhecimento,<br />

como ser feliz, enfim, uma série de questões que passam a ser colocadas, na<br />

modernidade, em nome da saúde dos indivíduos. O que pode, então, o analista<br />

aí? Como não sucumbir ao pedido de ser mais um objeto a ser ofertado ao<br />

sujeito para dar conta de seu mal-estar no mundo?<br />

Ao mesmo tempo, temos responsabilidades em pensar o que fazer com<br />

determinadas demandas que envolvem, para além do mal-estar do humano, o<br />

real da loucura – quando, por exemplo, deparamo-nos com pacientes completamente<br />

desertificados, abandonados, errantes, vazios de palavras, que sequer<br />

chegam a formular uma queixa. Em muitos casos, somos levados a criar dispositivos<br />

que simplesmente abram para a retomada do uso da palavra, escola onde<br />

aprendemos a frear o que possa haver de furor curandis em nós. Estamos sempre<br />

em presença de uma sensação de impotência que nos ronda, sobretudo quando<br />

nos deparamos, além da miséria social, com a miséria psíquica. Como conduzir<br />

o trabalho em meio aos atropelos de demandas que chegam a nós, que exercemos<br />

a clínica no âmbito público? Como fazer deste real algo transmissível?<br />

No seminário A lógica do fantasma, Lacan coloca a questão da transmissão,<br />

apontando que “a psicanálise não poderia mais que se situar na franja do<br />

discurso da ciência, quer dizer, nem dentro nem fora” (Lacan,1967). Este “nem<br />

dentro, nem fora”, trata-se de pensá-lo mesmo quando, na prática, com alguns<br />

psicóticos, nos deparamos com o apagamento radical do sujeito?<br />

Na primeira lição do seminário A angústia, Lacan vai de imediato afirmar<br />

que a estrutura do fantasma e a estrutura da angústia são a mesma, para, logo<br />

em seguida, abordar a angústia do analista:<br />

A angústia, diz ele, não é o que os sufoca enquanto psicanalistas.<br />

E, no entanto, não é demais dizer que o deveria – se posso dizer –<br />

na lógica das coisas, quer dizer, na relação que vocês têm com o<br />

paciente. Pois, sentir isto que o sujeito pode suportar da angústia<br />

é o que vos coloca à prova a todo instante (Lacan,1962, p. 13).<br />

Essas passagens de Lacan levaram-me a pensar nos momentos em que,<br />

no encontro com alguns pacientes, somos tomados por uma sensação corporal<br />

de extrema angústia, situações em que é difícil sustentar o desejo e a capacidade<br />

de seguir escutando e dialogando com eles, momentos em que nos depara-

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