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Ester Trevisan<br />
fortemente marcado, numa estrutura em que o discurso da medicina e o discurso<br />
da ciência se conjugam e são regidos por uma demanda social de normalização<br />
e controle. A demanda de saber sobre a saúde é colocada em permanência<br />
para aqueles que operam nas instituições de saúde: como ser saudável, como<br />
criar os filhos, o que comer, o quanto engordar, como retardar o envelhecimento,<br />
como ser feliz, enfim, uma série de questões que passam a ser colocadas, na<br />
modernidade, em nome da saúde dos indivíduos. O que pode, então, o analista<br />
aí? Como não sucumbir ao pedido de ser mais um objeto a ser ofertado ao<br />
sujeito para dar conta de seu mal-estar no mundo?<br />
Ao mesmo tempo, temos responsabilidades em pensar o que fazer com<br />
determinadas demandas que envolvem, para além do mal-estar do humano, o<br />
real da loucura – quando, por exemplo, deparamo-nos com pacientes completamente<br />
desertificados, abandonados, errantes, vazios de palavras, que sequer<br />
chegam a formular uma queixa. Em muitos casos, somos levados a criar dispositivos<br />
que simplesmente abram para a retomada do uso da palavra, escola onde<br />
aprendemos a frear o que possa haver de furor curandis em nós. Estamos sempre<br />
em presença de uma sensação de impotência que nos ronda, sobretudo quando<br />
nos deparamos, além da miséria social, com a miséria psíquica. Como conduzir<br />
o trabalho em meio aos atropelos de demandas que chegam a nós, que exercemos<br />
a clínica no âmbito público? Como fazer deste real algo transmissível?<br />
No seminário A lógica do fantasma, Lacan coloca a questão da transmissão,<br />
apontando que “a psicanálise não poderia mais que se situar na franja do<br />
discurso da ciência, quer dizer, nem dentro nem fora” (Lacan,1967). Este “nem<br />
dentro, nem fora”, trata-se de pensá-lo mesmo quando, na prática, com alguns<br />
psicóticos, nos deparamos com o apagamento radical do sujeito?<br />
Na primeira lição do seminário A angústia, Lacan vai de imediato afirmar<br />
que a estrutura do fantasma e a estrutura da angústia são a mesma, para, logo<br />
em seguida, abordar a angústia do analista:<br />
A angústia, diz ele, não é o que os sufoca enquanto psicanalistas.<br />
E, no entanto, não é demais dizer que o deveria – se posso dizer –<br />
na lógica das coisas, quer dizer, na relação que vocês têm com o<br />
paciente. Pois, sentir isto que o sujeito pode suportar da angústia<br />
é o que vos coloca à prova a todo instante (Lacan,1962, p. 13).<br />
Essas passagens de Lacan levaram-me a pensar nos momentos em que,<br />
no encontro com alguns pacientes, somos tomados por uma sensação corporal<br />
de extrema angústia, situações em que é difícil sustentar o desejo e a capacidade<br />
de seguir escutando e dialogando com eles, momentos em que nos depara-