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E, <strong>de</strong>pois, como para si mesmo:<br />
— Bravo ragazzo! Tanto buono!<br />
www.nead.unama.br<br />
Haviam-lhe posto a alcunha <strong>de</strong> Maricas pela sua <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za corpórea e <strong>de</strong><br />
maneiras, pelo tom efeminado <strong>de</strong> toda a sua pessoa e os cuidados escrupulosos<br />
com que a tratava. Tomava banho frio todas as manhãs, ensaboando-se com furor,<br />
como se quisesse arrancar da pele branca o cheiro nauseabundo e a poeira fina e<br />
negra do cubículo, e todas as semanas mandava-lhe a família uma pilha <strong>de</strong> roupa<br />
lavada e brunida.<br />
Era abastada e conhecida a sua família, que nele tinha o primeiro criminoso<br />
— segundo ela própria afirmava, consternada.<br />
Seu crime fora ter matado uma prostituta <strong>de</strong> alto bordo, em cuja casa<br />
pernoitara, com uma punhalada no coração, quando ela dormia; punhalada que fez<br />
seguir <strong>de</strong> mais 12 em vários pontos do corpo da <strong>de</strong>sgraçada: no baixo ventre, nos<br />
seios, nas coxas.<br />
Interrogado, quando preso, ao fim <strong>de</strong> alguns meses <strong>de</strong> pesquisas baldadas,<br />
confessou o <strong>de</strong>lito, dando como explicação <strong>de</strong>le o ciúme. Que amava aquela mulher;<br />
que lhe propusera mancebia, primeiro, casamento, <strong>de</strong>pois; como tudo ela recusasse,<br />
alegando querer conservar a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vonta<strong>de</strong> e <strong>de</strong> seu corpo, resolvera<br />
matá-la para impedir que pertencesse a outros homens. E tinha confessado tudo<br />
isso com a tranqüilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um justo.<br />
Na Detenção todos o estimavam muito pelo seu trato afável e pelo seu gênio<br />
serviçal, pronto sempre a obsequiar os companheiros — ou lendo, ou escrevendo<br />
para eles, ou dando-lhes conselhos e animação.<br />
Fora o chaveiro, o gordo Meireles, quem lhe pusera a alcunha <strong>de</strong> Maricas.<br />
Era uma das vaida<strong>de</strong>s do Meireles — ter um talento especial para "botar<br />
alcunhas." Com exceção dos hóspe<strong>de</strong>s já célebres, que traziam crisma <strong>de</strong> fora, era<br />
ele quem os crismava a todos. No cubículo 25 só o Barbas <strong>de</strong> Arame lhe escapara,<br />
pela aludida razão: era um nome <strong>de</strong> guerra, antigo e glorioso, que não podia ser<br />
mudado.<br />
Ao Fernando Gomes, não ousando, pela sua posição e respeitabilida<strong>de</strong>,<br />
botar uma alcunha humorística, e não se resignando a <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> rotulá-lo, passou a<br />
chamar-lhe Comendador, com muito respeito, no que a vítima nada viu <strong>de</strong><br />
extraordinário.<br />
O assassino da hetaira não gostou a princípio do cognome com que o<br />
distinguira o Meireles, a quem, em represália, <strong>de</strong>nominou Sancho Pança, e não sem<br />
alguma sorte, porque o nome ia pegando <strong>de</strong> cubículo em cubículo, aos poucos, mas<br />
em segredo, pelo receio que havia das iras do po<strong>de</strong>roso funcionário.<br />
Perto da porta dormia vestido o Pulso <strong>de</strong> Ferro, um português alto e forte<br />
como uma torre, que, numa rixa com um patrício, o esten<strong>de</strong>ra morto com um<br />
formidável murro em uma das têmporas. Esperava-se que seria absolvido, por<br />
parecer bem provada a justificativa da legítima <strong>de</strong>fesa, visto que se encontrara um<br />
revólver na mão do morto.<br />
Por último, no ângulo direito do cubículo, encostado à pare<strong>de</strong> e voltado para<br />
ela, estava Fernando Gomes, imóvel. No chão, ao lado da cama asseada, via-se um<br />
tinteiro, cigarros, uma caneta com pena, vários papéis esparsos e duas ou três<br />
brochuras.<br />
Macaroni, tendo acabado o cigarro, atirou com a ponta para o meio do<br />
quarto, acompanhando-a com uma cusparada, que foi apagá-la. Depois ergueu-se,<br />
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