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www.nead.unama.br<br />
Quando voltava da porta viu sobre o mármore da mesinha da cabeceira a<br />
pequena ban<strong>de</strong>ja <strong>de</strong> charão com a xícara <strong>de</strong> café.<br />
— Olha o meu remédio! — exclamou, rindo. Vamos tomá-lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>?<br />
E os dois tomaram o café, ora aos goles, um, ora outro; e ela, quando bebeu<br />
o último trago, limpou os lábios úmidos ao lenço do amante, tirando-lho do bolso<br />
externo do paletó.<br />
Corina estava <strong>de</strong> pé, com os cabelos meio soltos, corada, risonha,<br />
resplan<strong>de</strong>cente nas suas vestes brancas, banhadas em cheio pela luz do gás, na<br />
niti<strong>de</strong>z dos seus <strong>de</strong>ntes, no viço triunfal da sua mocida<strong>de</strong>... Paulino, fremente, a<br />
garganta e a boca ressequidas, os olhos dilatados, ar<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> um fogo sombrio,<br />
abraçou-a a plenos braços, perdidamente, num ímpeto <strong>de</strong> molas <strong>de</strong> aço, e, tendo-a<br />
unida ao peito, quase suspensa do chão, tentava levá-la para a otomana; mas a<br />
moça, pressentindo-lhe a intenção, e, temendo àquela idéia, <strong>de</strong> uma repugnância<br />
instintiva, <strong>de</strong> um como terror subitâneo, enteiriçou-se num violento esforço <strong>de</strong> todos<br />
os músculos e, partindo a ca<strong>de</strong>ia formada pelos braços do médico, soltou-se, fugiulhe,<br />
foi refugiar-se num canto do aposento, caindo sobre um pufe <strong>de</strong> seda. E<br />
murmurava, cobrindo o rosto com as mãos:<br />
— Não, não, isso não, Paulino... Não posso, não quero...<br />
Mas Paulino estava <strong>de</strong> tal modo excitado, louco <strong>de</strong> paixão e <strong>de</strong>sejos, que<br />
naquela ocasião não recuaria nem mesmo diante da sua própria consciência<br />
corporificada num anjo vingador, empunhando uma espada <strong>de</strong> chamas.<br />
Ele foi ajoelhar-se-lhe aos pés, cobriu-os <strong>de</strong> beijos, prostrado como um<br />
maometano que oscula o limiar da mesquita. Depois, <strong>de</strong>bruçou-se-lhe ao regaço,<br />
com a cabeça erguida para o seu rosto, que empali<strong>de</strong>cia, pren<strong>de</strong>ndo-lhe as mãos,<br />
falando-lhe baixinho, longamente, ar<strong>de</strong>ntemente.<br />
Corina, que havia preparado com calma a ocasião e o cenário da própria<br />
queda, sem uma revolta <strong>de</strong> pudor, numa absorção <strong>de</strong> toda a sua inteligência e <strong>de</strong><br />
toda a sua vonta<strong>de</strong> no <strong>de</strong>sejo apaixonado <strong>de</strong> entregar-se àquele homem, <strong>de</strong> cujo<br />
amor sentia o calor e o perfume capitoso... chegando o momento <strong>de</strong>sejado, previsto,<br />
sonhado... sentia acordar violentamente em todo o seu ser, no fundo <strong>de</strong> si mesma,<br />
uma força não sabida, que a requeimava intimamente, e lhe dava o <strong>de</strong>sejo imperioso<br />
<strong>de</strong> fugir ao contato daquele homem, como se fora um monstro. Era o pudor, era o<br />
respeito <strong>de</strong> si própria, que <strong>de</strong>spertava imperioso, forte, intato, numa revolta soberba.<br />
Todas as ousadias e petulâncias da coquete <strong>de</strong>sapareciam ao primeiro contato<br />
brutal do homem que não era o companheiro que a lei lhe <strong>de</strong>ra e a cujo corpo a<br />
convivência longa a habituara; e uma vergonha imensa, amargurada, enchia-a <strong>de</strong><br />
pejo, <strong>de</strong> raiva, <strong>de</strong> lástima...<br />
Mas Paulino sentara-se na otomana, ao seu lado; tomou-lhe a formosa<br />
cabeça, pousou-a sobre a sua larga espádua e pegou <strong>de</strong> beijar-lhe levemente,<br />
docemente, os olhos cerrados, as faces pálidas, os lábios frios e trêmulos. Não sei<br />
que frase feliz, <strong>de</strong> fino espírito, murmurou Paulino, que a moça sorriu-se e volveu<br />
para ele os olhos, exclamando um oh! Meio <strong>de</strong> censura, meio <strong>de</strong> aprovação.<br />
Paulino, então, aproveitando o ensejo, ergueu-lhe o corpo macio, docemente<br />
cálido, sob as cambraias finas, e sentou-a sobre os joelhos; estreitou-lhe o busto, em<br />
que fremiam os últimos gestos <strong>de</strong> resistência, e colou-lhe a boca à boca.<br />
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