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Flor de Sangue - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Porque... a noite está fresca... po<strong>de</strong> resfriar-se... é tão tar<strong>de</strong>... tem <strong>de</strong><br />

voltar sozinha...<br />

— Lá por isso não, porque eu levo a Maurícia.<br />

Tocou o tímpano; a velha mucama apareceu logo; pediu-lhe uma mantilha,<br />

<strong>de</strong>u-lhe or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> acompanhá-la até ao Mirante (era o nome por que os criados<br />

conheciam o belve<strong>de</strong>re) e saíram pouco <strong>de</strong>pois.<br />

A noite estava tão clara, tão perfumada, tão calma como a da véspera. Era o<br />

mesmo amável irresistível, a mesma irresistível poesia, escorrendo no luar,<br />

suspirando nos murmúrios vagos das folhas, exalando-se em aromas fortes das<br />

"flores <strong>de</strong> baile", dos jasmineiros, dos rosais, das madressilvas...<br />

Corina apoiou-se languidamente ao braço do médico e foram subindo<br />

lentamente o aclive, em silêncio. A moça sentia no braço a repercussão surda e<br />

precipite das pancadas do coração do seu companheiro e tremer-lhe o braço <strong>de</strong> vez<br />

em quando.<br />

Chegaram por fim. O médico abriu a porta, acen<strong>de</strong>u o bico <strong>de</strong> gás que havia<br />

logo à entrada e esten<strong>de</strong>u a mão para <strong>de</strong>spedir-se.<br />

— Espere, vou levá-lo até acima; quero ver se lhe arrumaram bem o<br />

gabinete e o quarto...<br />

Maurícia estava do lado <strong>de</strong> fora, encostada a um dos batentes.<br />

— Está louca? E Maurícia? E Alfred?<br />

— Alfred ainda não voltou da rua. A rapariga subirá também. Sobe, Maurícia.<br />

E galgou trefegamente as escadas em espiral, <strong>de</strong> <strong>de</strong>graus altos e estreitos.<br />

Paulino seguiu-a, apoiando-se ao corrimão, cambaleando como um ébrio.<br />

Ao entrar na saleta, às escuras, sentiu a respiração ofegante da moça,<br />

fatigada da ascensão; tirou a caixa <strong>de</strong> fósforos para acen<strong>de</strong>r o gás, mas estava tão<br />

trêmulo das mãos que a caixinha caiu ao chão. Caminhando e procurando-a com o<br />

pé, esbarrou com a moça no centro da saleta. Deu um pequeno grito e, como lhe<br />

sentisse o corpo vacilar, amparou-a nos braços.<br />

— Paulino — murmurou a voz <strong>de</strong> Corina, trêmula, entrecortada <strong>de</strong> emoção,<br />

bafejando um hálito <strong>de</strong> fogo.<br />

Tolheram-lhe a voz sobre os lábios outros lábios, igualmente secos e<br />

ar<strong>de</strong>ntes.<br />

Durou tudo isso alguns segundos.<br />

Quando a chama do gás rebentou na aran<strong>de</strong>la, viu Corina sentada numa<br />

ca<strong>de</strong>ira, com a cabeça nas mãos e os cotovelos sobre a mesa, e a mucama em pé,<br />

junto à porta. O médico disfarçou a comoção indo <strong>de</strong>por o chapéu e a bengala a um<br />

canto e graduando a luz.<br />

Corina tirou logo a face das mãos, ergueu-se, passou uma vista <strong>de</strong> olhos em<br />

torno e exclamou, afetando calma e indiferença:<br />

— Está tudo em or<strong>de</strong>m. Agora que o <strong>de</strong>ixo em casa, vou-me embora. Muito<br />

boa noite — e esten<strong>de</strong>u-lhe a mão, <strong>de</strong> frente, sorrindo. Paulino apertou-lha<br />

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