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Flor de Sangue - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Ele afastou-o brandamente, murmurando muito baixo, com a voz velada e<br />

sombria <strong>de</strong> um hipnotizado:<br />

— É singular, é singular...<br />

E <strong>de</strong> repente:<br />

— Dê-me essa carta... Dê-ma!<br />

O médico, sem se apressar a entregar-lha, observou-lhe muito calmo:<br />

— Ignoro o conteúdo <strong>de</strong>sta carta, nem o dr. Paulino me revelou qual fosse.<br />

Apenas me or<strong>de</strong>nou que só a entregasse naquela <strong>de</strong>terminada circunstância e que o<br />

fizesse em pessoa, recomendando-me mais que tomasse as providências<br />

necessárias para o caso <strong>de</strong> eu falecer antes <strong>de</strong> tal circunstância realizar-se, <strong>de</strong><br />

modo que a sua última vonta<strong>de</strong> fosse cumprida. Obe<strong>de</strong>ci com religioso escrúpulo às<br />

or<strong>de</strong>ns do meu pobre amigo e...<br />

— Mas por que não me fez entrega mais cedo <strong>de</strong>sse documento? Há três<br />

meses que se realizou a condição tão singularmente prevista por ele e, entretanto,<br />

só hoje é que V. Sa. me honra com a sua visita.<br />

— Estive doente, absolutamente impossibilitado <strong>de</strong> fazer esta viagem. Ora,<br />

como era indispensável que eu fizesse pessoalmente a entrega, tive <strong>de</strong> esperar o<br />

meu restabelecimento. Aqui tem a carta. Faço votos para que a sua leitura lhe traga<br />

um bálsamo às dores morais que o afligem e que o resultado do seu próximo<br />

julgamento seja, como é <strong>de</strong> justiça, a restituição à nossa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> um dos seus<br />

mais belos ornamentos — concluiu o dr. Itaparica, com um ar prudhommesco,<br />

erguendo-se.<br />

Apertou gravemente a mão <strong>de</strong> Fernando — estava fria e viscosa como a <strong>de</strong><br />

um <strong>de</strong>smaiado.<br />

O preso guardou a carta no bolso interno do paletó e, acompanhado<br />

novamente pelo guarda, pediu e obteve licença para ir passear no jardim da prisão.<br />

A vegetação mesquinha e raquítica tinha um ar <strong>de</strong> cansaço e tristeza; as<br />

copas dos arvoredos estavam cobertas <strong>de</strong> poeira; o terreno estava seco, em torrões<br />

negros. Nenhuma viração agitava as folhas; nenhuma flor alegrava a vista. A<br />

atmosfera pesava e cheirava mal.<br />

Mas o pobre <strong>de</strong>tento não tinha a impressão consciente daquele meio<br />

<strong>de</strong>sagradável e opressor, que, entretanto, <strong>de</strong>via acabrunhar-lhe o espírito, mau<br />

grado seu. Três ou quatro homens passeavam, fumando e conversando. Umas<br />

crianças riam e corriam <strong>de</strong>scuidosamente, tentando empinar um papagaio, empresa<br />

que a falta <strong>de</strong> vento tornava impossível.<br />

Fernando procurou um recanto isolado; aí sentou-se e abriu com as mãos<br />

trêmulas o sobrescrito misterioso, tirou <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro algumas folhas <strong>de</strong> papel, e leu<br />

sofregamente o que nelas escrevera cinco anos antes o dr. Paulino <strong>de</strong> Castro.<br />

CAPÍTULO VII<br />

A CARTA<br />

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