15.04.2013 Views

Flor de Sangue - Unama

Flor de Sangue - Unama

Flor de Sangue - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

Com o fim <strong>de</strong> afastar suspeitas, encontravam-se fora <strong>de</strong> casa, para se<br />

possuírem em liberda<strong>de</strong>. A boa dona Miquelina foi aproveitada. Era na sua alcova<br />

pobre, na sua velha cama poluída por amores <strong>de</strong> ocasião e pelo dinheiro do aluguel,<br />

que se amavam mais vezes. Mas, por fim, à alma caprichosa e à fantasia trêfega <strong>de</strong><br />

Corina aquela pobreza torpe repugnou; pediu ao amante coisa melhor, mais digna<br />

<strong>de</strong>les. Paulino, que só queria a ela, ao seu corpo olímpico, pouco lhe importando a<br />

moldura, e a quem aquele retiro calmo e seguro encantava, não ce<strong>de</strong>u sem pesar á<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Corina. Propôs-lhe passarem uma noite no Jardim Botânico, num dos<br />

pavilhões do Campesino, o famoso restaurante dos encontros galantes.<br />

Ela diria em casa que ia dormir com a madrinha; ele avisaria o Alfred que<br />

passaria a noite chez Ma<strong>de</strong>lon e, assim, teriam toda a tar<strong>de</strong> e noite para se amarem<br />

livremente, em sossego, em pleno campo. Corina aceitou a idéia com palmas e<br />

gritinhos <strong>de</strong> alegria e pagou-lha com beijos sem conta.<br />

Às cinco horas da tar<strong>de</strong> Paulino entrava no largo do Machado em um cupê<br />

<strong>de</strong> estores baixados, no qual o esperava Corina; entrou rapidamente, batendo com a<br />

portinhola, com cuidado. E o cupê misterioso rodou velozmente para o Jardim. à<br />

porta <strong>de</strong>ste apearam-se; e Paulino <strong>de</strong>spediu o carro, dizendo ao cocheiro que<br />

voltasse a buscá-los no dia seguinte às oito horas da manhã, <strong>de</strong>vendo esperá-los no<br />

mesmo ponto.<br />

Entraram; passearam longamente, ela apoiada com langui<strong>de</strong>z ao braço <strong>de</strong>le,<br />

amolentados ambos pela tristeza da hora; e os seus vultos unidos perdiam-se longe,<br />

pequeninos e nítidos, no fim da rua admirável <strong>de</strong> palmeiras, inteiramente <strong>de</strong>serta.<br />

Mas anoitecia e o apetite apertava. Retroce<strong>de</strong>ram, entraram no jardinete do<br />

Campesino e, tendo Paulino mandado servir o jantar, foram esperá-lo no pequeno<br />

pavilhão alugado para aquele dia.<br />

Corina, com os seus hábitos <strong>de</strong> coquetismo e <strong>de</strong> asseio, havia arrumado e<br />

levado numa malinha <strong>de</strong> couro da Rússia e fechos <strong>de</strong> níquel um necessário <strong>de</strong><br />

toalete e alguns arranjos para a noite. Entrando no quarto, cujas quatro janelas<br />

estavam abertas, <strong>de</strong>pôs a maleta, o leque e a sombrinha sobre a cômoda, em frente<br />

à cama larga, feita <strong>de</strong> fresco, com o seu cortinado <strong>de</strong> filó, muito encardido das<br />

<strong>de</strong>jeções das moscas, enfeitado com uns laços <strong>de</strong> fita <strong>de</strong>sbotados.<br />

A mesa para o jantar estava pronta; sobre a toalha branca dois talheres,<br />

duas baterias <strong>de</strong> copos <strong>de</strong> várias cores, e os hors d'oeuvre — azeitonas brancas<br />

enormes, manteiga fresca, anchois, rabanetes.<br />

— Ah! Como se está bem aqui! Como é chique! Isto sim; não é como aquela<br />

pocilga da Miquelina.<br />

Daí a pouco entrava um garçom corretamente encasacado. Foi uma<br />

lembrança feliz <strong>de</strong> Paulino a casaca e a gravata branca do garçom, porque Corina<br />

ficou encantada com esse <strong>de</strong>talhe chique, pensando logo em Paris.<br />

O jantar, cujo menu Paulino escolhera com arte, foi um encanto. Corina<br />

estava radiante, e nos seus lábios róseos sumia-se facilmente, entre risos, o âmbar<br />

líquido do champanha, que os lábios <strong>de</strong> Paulino vinham às vezes disputar-lhe,<br />

sorvendo-o avidamente.<br />

Findo o jantar e para que o criado retirasse o serviço <strong>de</strong> mesa e arrumasse o<br />

quarto, foram dar um passeio pela rua <strong>de</strong>serta ele com o charuto aceso, ela, meio<br />

aturdida pelos vinhos, com um quebranto lânguido no corpo e uma alegria excessiva<br />

na alma, rindo a propósito <strong>de</strong> tudo e obrigando Paulino a parar, para beijá-lo ali, ao<br />

68

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!