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Brian L. Weiss <strong>Muitos</strong> <strong>corpos</strong>, <strong>uma</strong> <strong>só</strong> <strong>Alma</strong><br />
- Ele cala-me como a um motor de um carro. Já desisti de tentar. Combatê-lo é como<br />
combater um exército da Inquisição.<br />
- Então e a sua mãe? Ela pode ajudar?<br />
- Ela não pode ajudar-se a si própria. A minha mãe é simplesmente <strong>uma</strong> decoração, como<br />
um vaso de flores. Ela cala-se porque sabe que ele podia substituí-la quando lhe<br />
apetecesse.<br />
- Mas não o fez.<br />
- Claro que fez, um milhão de vezes. Ele mantém as suas mulheres em apartamentos ou<br />
em hotéis, dependendo do que ele sente por elas ser sério ou não. Na sua religião, o<br />
divórcio não é permitido. Eu desafiei-a e divorciei-me há quatro anos. Ele quase me matou<br />
quando me divorciei; <strong>só</strong> quando percebeu que precisava de mim é que me deixou vir para a<br />
América.<br />
- A sua mãe sabe das outras mulheres?<br />
- Era parva se não soubesse. - Cristina fez <strong>uma</strong> pausa. - Mas, pensando bem, ela é parva!<br />
Não comentei a sua amargura.<br />
- É filha única?<br />
- Única filha. Tenho dois irmãos mais velhos.<br />
- Eles também trabalham no negócio?<br />
- Trabalhar é a palavra errada. Eles vêm ao escritório e saem para almoçar.<br />
- No entanto conseguem as promoções, o respeito. Dão-lhes ouvidos. - Tentei adivinhar.<br />
- O meu pai é demasiado astuto para ouvir os conselhos deles. Mas tem razão acerca das<br />
promoções e do respeito. Está a ver, eu sou mulher e não mereço nenhum deles.<br />
Era <strong>uma</strong> queixa familiar das mulheres latinas, sufocadas por <strong>uma</strong> cultura que não tinha<br />
progredido para o século XX. Ela era obviamente a estrela da família, mas não brilhava,<br />
encoberta pela nuvem de tradição e tacanhez.<br />
- Porque é que não se vai embora, arrisca por sua conta?<br />
Foi como se a tivesse acusado de homicídio. Empalidecendo, empurrou a cadeira para trás,<br />
levantou-se e depois voltou a atirar-se para a cadeira. Começou a chorar, desfazendo-se<br />
por causa do que me parecia ser <strong>uma</strong> pergunta óbvia.<br />
- Não sei - lamentou-se, toda a sofisticação perdida, subitamente sem defesas. - Por favor,<br />
por favor. Preciso da sua ajuda!<br />
A mudança nela foi tão súbita que, além de um murmurado «Claro que ajudo», fiquei<br />
espantado.<br />
- Diga-me qual é o problema - disse eu. - Seja o mais precisa possível.<br />
Ela olhou para mim com os olhos cheios de lágrimas e respirou com dificuldade.<br />
- Tem de perceber <strong>uma</strong> coisa: eu amo o meu pai. Independentemente do que eu lhe diga,<br />
essa é a verdade subjacente.<br />
Ama-o e odeia-o, pensei. Dificilmente um conflito emocional único.<br />
- Quando ele veio para a América, deixando-me a mim e ao meu marido e às bebés para<br />
trás, senti-me aliviada. Os meus irmãos vieram com ele, e parecia que com a sua partida eu<br />
estava livre de todas as repressões, de todas as pressões que me eram impostas por um<br />
patriarca brasileiro tirânico à moda antiga. - Ela riu-se com arrependimento. - Homens mil,<br />
mulheres zero. Ele nunca me bateu, nunca foi cruel. Pelo contrário, deu-me tudo o que eu<br />
quis e foi esse o problema. Nunca o ganhei - ou, melhor, ganhei-o por ser obediente.<br />
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