102 SocioPoética - <strong>Volume</strong> 1 | <strong>Número</strong> 8 julho a dezembro de 2011 do texto revelação condensado ao extremo. Toda a realidade é apresentada no sétimo selo de forma multidimensional: fala do juízo do mundo e do demoníaco, da salvação e da recompensa dos justos, de blasfêmias dos ímpios, dos louvores das vítimas, de pragas contra os astros, contra o mar, contra as plantas, de trevas do reino do Anticristo. Todo o mundo divino, demoníaco e humano está ali contido, em texto condensado, imagens fortes e agressivas, metáforas, desdobramentos alegóricos das mesmas, fusões e distorções de textos dos profetas, há hinos e explosões de alegria, enfim, tudo está nesta palavra em potência, no sétimo selo, abertura de um dos mais fascinantes labirintos da palavra. O sétimo selo, uma vez aberto, desencadeia uma narrativa do todo, palavra em potência. Este labirinto é um mundo de virtualidades, com poder de revelar a realidade como nenhuma narrativa linear o faria. O sétimo selo, esta palavra em potência é uma metonímia de todo o Apocalipse. É por isso que seu conteúdo é “vazio”, é uma epifania divina no templo celeste. É nesta complexidade dos jogos da linguagem, de revelação na materialidade do texto, que se dá a base da relação apocalipse e literatura. Neste sentido, me chamou a atenção a ausência de interpretações da obra de Jorge Luis Borges no volume Los imaginários apocalípticos en la literatura hispano-americana contemporânea, a que fiz referência no início deste artigo. Não é um problema apenas deste livro, mas também de outras abordagens apocalípticas da literatura latino-americana. Textos como El Jardin de los Senderos que se Bifurcan, Las Ruinas Circulares, El Aleph, entre tantos outros, com seu poder labiríntico de desarticular nossa compreensão quotidiana de realidade, são escrituras apocalípticas no sentido que atribuímos ao termo. Repetindo: apocalipse tem que ver com narrativas não lineares, com alto poder metafórico, cujo jogo é a perda e o reencontro do leitor no texto, no exercício de aprendizado e ressignificação da enciclopédica linguagem ali proposta. Qualquer exercício de discussão das relações entre apocalipse e literatura, em especial a literatura latino-americana do século XX e XXI, se enriquecerá muito se debater com este paradigma de escritura apocalíptica. Referências bibliográficas: Apócrifos del Antiguo Testamento, Tomo IV, Ciclo de Henoc, Alejandro Diez Macho (ed.). Madrid: Cristiandad, 1984. Apócrifos del Antiguo Testamento, Tomo VI, Literatura Apocalíptica Alejandro Diez Macho & Antonio Piñero (ed.). Madrid: Cristiandad, 2009. Beato de Liébana. Obras completas e complementarias. 2 Vl. Joaquim Gonzalez Echegaray, Alberto del Campo & Leslie G. Freeman (eds.). Madrid: BAC, 2004. Bíblia Sagrada. Antigo e Novo Testamento. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. 2ª Edição Atualizada e Revista no Brasil. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
SocioPoética - <strong>Volume</strong> 1 | <strong>Número</strong> 8 julho a dezembro de 2011 Fabry, Geneviéve., Logie, Ilse, Decock, Pablo. (eds.). Los imaginários apocalípticos en la literatura hispano-americana contemporânea. Bern: Peter Lang, 2010. Frye, Northrop. Anatomy of Criticism. Four Essays. Princeton: Princeton University Press, 1990. Meletinski, Eleazar M. El Mito. Literatura y folclore. Madrid: Akal, 2001. Novum Testamentum Graece. Editione vicesima septima revisa. Eberhard Nestle, Erwin Nestle, Kurt Aland, et alii. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 2001. The Old Testament Pseudepigrapha, <strong>Volume</strong> one: Apocalyptic Literature and Testaments, James H. Charlesworth (ed.). London: Darton, Logman & Todd, 1983. 103