Volume 1 - Número 8 - EDUEP - Uepb
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SocioPoética - <strong>Volume</strong> 1 | <strong>Número</strong> 8<br />
julho a dezembro de 2011<br />
Estudos recentes têm insistido na frutífera tese de que o imaginário e estruturas<br />
literárias apocalípticas operam de forma estruturante na literatura ocidental e<br />
latino-americana. Este é o caso do belo volume organizado por Geneviéve Fabry,<br />
Ilse Logie e Pablo Decock, intitulado Los imaginários apocalípticos en la literatura<br />
hispano-americana contemporânea. Nele são abordados aspectos de cultura apocalíptica<br />
que marcam autores fundamentais como Vargas-Losa, Cortázar, Bolaño,<br />
Vallejo. Os ensaios deste livro dedicam mais espaço a escritores contemporâneos<br />
do Cono Sur. Sua hipótese de trabalho, que consideramos válida e que tornamos<br />
nossa neste artigo, na relação geral entre literatura e apocalipse, é que: “el mito<br />
fundacional del apocalipsis despliega um imaginário subyacente em muchas obras<br />
representativas de la literatura hispano-americana de los siglos XX e XXI em general,<br />
y de la narrativa conosureña em particular” 1 . Nosso objetivo neste artigo não é<br />
demonstrar a validade desta hipótese em relação à literatura brasileira ou a outros<br />
autores latino-americanos, mas insistir mais na aproximação temática e formal entre<br />
os apocalipses, o imaginário apocalíptico e a literatura 2 . Queremos revisitar os parâmetros<br />
da relação mimética entre literatura e apocalipse com o objetivo de ampliar<br />
as possibilidades de estudo comparativo e arquetípico desta relação. A constatação<br />
inicial, fazendo coro à obra acima mencionada, é que as narrativas apocalípticas<br />
parecem ecoar profundamente em nossas formas de ficção, fornecendo modelos,<br />
paradigmas, enredos e, se nos permitirmos usar uma palavra desgastada, mas ainda<br />
útil: arquétipos. Já nos chamavam a atenção a este aspecto de relação arquetípica<br />
entre formas do mito (e do Apocalipse) e literatura as obras de Northrop Frye e<br />
Eleazar Meletinsky, que estudaram estas estruturas narrativas míticas recorrentes e<br />
estruturantes, que derivando seu poder do mundo da metáfora (como é próprio ao<br />
mito) se atualizam em novas produções de grande riqueza polissêmica.<br />
Northrop Frye foi o autor que introduziu o conceito “apocalíptico” nesta relação<br />
com a literatura ao contrapô-lo ao demoníaco. 3 Ele entende como apocalípticas<br />
as metáforas bíblicas do âmbito animal, vegetal, mineral, social, etc. que apontam<br />
ao paradisíaco, à sociedade e ao cosmo restaurados, à união com Deus nos novos<br />
céus e nova terra e na Nova Jerusalém. As imagens demoníacas provém dos mesmos<br />
âmbitos mas contrastam com aquelas ao apresentar um mundo desarmonioso,<br />
caótico, dissociado do divino e do paradisíaco. Estas oposições entre apocalíptico<br />
e demoníaco têm uma função didática em Frye e oferecem uma poderosa classificação<br />
das metáforas que ajudam a guiar o intérprete na leitura da literatura e da<br />
cultura. Mas para o leitor dos apocalipses antigos as oposições esquemáticas de<br />
imagens proposta por Frye criam certo desconforto. Quem se debruça sobre um<br />
apocalipse como o Apocalipse de João sabe que o seu conceito de revelação precisa<br />
1 Bern: Peter Lang, 2010, p.11.<br />
2 Vamos usar os conceitos da seguinte forma: Apocalipse (maiúsculo), como o livro do Apocalipse de João;<br />
apocalipse, como gênero literário e estrutura de idéias; apocalipses (no plural), como obras do gênero apocalipse,<br />
procedentes do judaísmo antigo e do cristianismo primitivo.<br />
3 Anatomy of Criticism. Four Essays. Princeton: Princeton University Press, 1990, em especial no segundo e<br />
no terceiro ensaios, p. 71-239.