Volume 1 - Número 8 - EDUEP - Uepb
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SocioPoética - <strong>Volume</strong> 1 | <strong>Número</strong> 8<br />
julho a dezembro de 2011<br />
que intentam realizar esse feito de ultrapassar a linguagem e aceder à verdadeira<br />
realidade das coisas: nos rituais tântricos há os mantras, espécie de sons sagrados e<br />
vazios de sentido que representam todos os sons e, portanto, a vacuidade de todos<br />
os sons; já no zen-budismo têm-se os koans, que são considerados pelos seguidores<br />
do zen como um meio de liberação da consciência. Vamos nos deter um pouco<br />
sobre os koans, tentando perceber como essa forma discursiva específica opera no<br />
intuito de ‘liberar’ a mente da linguagem.<br />
Segundo observa Arnau, o uso dos koans é uma forma de meditar ‘olhando dentro<br />
das palavras’, com o objetivo de interromper o processo cognitivo lógico-racional<br />
e preparar o discípulo para uma experiência não-verbal da realidade. Os koans são<br />
enigmas verbais, à primeira vista sem sentido, que não podem ser resolvidos pelo<br />
raciocínio. Outra característica é a impossibilidade, como em um poema, de paráfrase,<br />
e os aspectos irônicos, paradoxais ou absurdos e, por que não, bem-humorado<br />
dos mesmos. D. T. Suzuki, um dos grandes divulgadores do zen-budismo no ocidente<br />
assim define o koan:<br />
O koan não é nem um enigma nem uma observação misteriosa. Ele<br />
tem o objetivo mais definido: o levantamento da dúvida, impulsionando-a<br />
até os limites últimos. Uma afirmativa construída sobre bases<br />
lógicas é aproximável somente por sua racionalidade. Qualquer dúvida<br />
ou dificuldade que possamos ter a seu respeito dissolve-se quando<br />
continuamos com o fluxo natural das idéias. Os rios desembocam no<br />
oceano, mas o koan é uma parede de ferro barrando o caminho e ameaçando<br />
subjugar o nosso esforço intelectual, ao tentarmos superá-lo.<br />
Quando Joshu diz: ‘O cipestre do pátio’, ou quando Hakuin mostra<br />
uma das suas mãos, não há forma lógica possível para o entendimento.<br />
Sentimos como se fosse subitamente parada a marcha do pensamento.<br />
Hesitas, duvidas, estás perturbado, não sabendo como romper a parede<br />
que parece intransponível. Quando este clímax é atingido, tua personalidade<br />
inteira, tua vontade mais profunda, resolve conseguir uma<br />
saída para o caso, arremessa-s a si mesma, sem cogitar do ser ou não-ser,<br />
contra a parede de ferro do koan. Esse arremesso inesperado de todo<br />
o ser contra o koan abre uma região da mente até então desconhecida.<br />
Intelectualmente, é um transcender dos limites do dualismo lógico. É,<br />
ao mesmo tempo, uma regeneração, o despertar de um sentido interno,<br />
que permite ao indivíduo uma visão do autêntico funcionamento das<br />
coisas (SUZUKI, 2005, p. 133).<br />
Novamente aqui aparece a questão dos limites da consciência cotidiana e o postulado<br />
de uma experiência de liberação do modo de operação discursivo, com um<br />
conseqüente ganho cognitivo em relação à compreensão da realidade circundante.<br />
Sobre os koans Arnau afirma ainda que os mesmos são uma espécie de antídoto<br />
para aliviar os sintomas da enfermidade da linguagem, e uma terapia para combater<br />
os vícios do pensamento discursivo (p. 94). Chega-se então a questão exata que<br />
nos interessa examinar: haverá um outro modo de pensamento/linguagem que não<br />
o discursivo? A mística abriria caminho para encontrar esse caminho? È possível<br />
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