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D - SANTOS, JOSALBA FABIANA DOS.pdf - Universidade Federal ...

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uma maneira de se tentar afastar o passado, como a frisar aquele lugar-comum que<br />

afirma que o importante é viver o momento. Por outro lado, é possível dizer com<br />

Ricoeur que a narrativa se protege do esquecimento da morte. Isto é, na medida em<br />

que se é aquilo que se diz sobre si, a palavra escrita "garante" a continuidade dessa<br />

existência. No entanto, o registro mais minucioso não garante absolutamente nada<br />

num texto como A céu aberto, em que se põe em dúvida uma série de informações<br />

dadas anteriormente:<br />

Ela apoiava as pernas em volta dos meus quadris e na onda dessa posição esporrei três<br />

vezes. Quem sabe numa dessas tenha lançado nela a semente de uma outra criança. De<br />

outra? E já houvera mesmo uma anterior? E o meu irmão, o meu irmão que presumivelmente<br />

hibernava dentro dela, como receberia essa sementinha como companheira? Não pude<br />

deixar de rir ali quando lembrei dele: uma farsa montada por mim? Ou esse irmão havia de<br />

fato existido com sua própria face, tornando-se de repente apenas uma imagem turva para<br />

que a face de minha mulher pudesse reinar... O certo, o certo é que ainda lembrava muito<br />

bem... eu apenas o levara ao campo de batalha para pedir ao nosso pai algum amparo para a<br />

saúde dele. Acabou o meu irmão vestido de noiva ou coisa do gênero, eu virei um desertor,<br />

bonito não? Um desertor, estou aqui prestes a fugir não sei para onde, depois de ter<br />

participado de uma foda exemplar para ninguém botar defeito. Se eu hoje lembro, ainda me<br />

arde. (NOLL, 1996, pp. 137-138)<br />

Um fator que deixa bastante clara a diferença entre um texto em primeira e<br />

um em terceira pessoa, é o da experiência. Ou seja, não é um narrador distante ou<br />

até mesmo intruso que relata as ações do outro. Nesse sentido não se estabelece<br />

uma relação de alteridade. Quem relata é quem vive a ação. Claro que isso não<br />

significa que um narrador em primeira pessoa seja mais capaz ou menos capaz de<br />

relatar sua experiência do que um em terceira seria no que se refere a essa mesma<br />

experiência. O que quase os opõe é o ponto de vista, o texto emana de um prisma<br />

muito particular. O narrador em primeira pessoa desconhece os sentimentos mais<br />

profundos dos outros personagens que não ele próprio. Em contrapartida, só<br />

revelará de si aquilo que crer necessário revelar, criará de si a imagem que desejar<br />

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