13.04.2013 Views

Prosa - Academia Brasileira de Letras

Prosa - Academia Brasileira de Letras

Prosa - Academia Brasileira de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Gilberto Felisberto Vasconcellos<br />

ção. Eis o fabulativo Cascudo: “Um sabiá me disse que o pacotinho <strong>de</strong> alimentos<br />

cientificamente dosados que lhe ponho na gaiola não vale uma minhoca<br />

viva ou uma goiaba madura”.<br />

A refeição banalizada é indício <strong>de</strong> que alguma coisa anda mal conosco e<br />

com a civilização. O paladar é o sentido que mais regrediu nos tempos mo<strong>de</strong>rnos.<br />

Gravíssima a acusação feita por Luís da Câmara Cascudo: “O paladar<br />

não tem quem o <strong>de</strong>fenda naqueles que o per<strong>de</strong>ram no embotamento mecânico<br />

das refeições distraídas, no automatismo displicente e diário”. Nesses<br />

dois intelectuais humanistas brasileiros, avulta a reflexão acerca do paladar<br />

como guardião da nacionalida<strong>de</strong>. Silva Mello <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> retornar<br />

à ancestralida<strong>de</strong> alimentar, fixando a priorida<strong>de</strong> absoluta do alimento<br />

antigo, afirmando com isso a idéia <strong>de</strong> que é possível manter a antigüida<strong>de</strong> em<br />

matéria <strong>de</strong> alimentação. País novo, porém dotado <strong>de</strong> alimentação antiga. Segundo<br />

Luís da Câmara Cascudo, a mandioca é a rainha dos trópicos. Em seu<br />

estupendo livro Geografia do Brasil Holandês, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco,<br />

Paraíba, Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, Ceará, Maranhão, volta ao tema da mandioca. Esta é<br />

quem separa o português do holandês, “fiel às comidas flamengas, salsichas,<br />

presuntos afiambrados, toucinhos <strong>de</strong>ftimados, cervejas, cevadinha, peixe salpreso,<br />

trazido em salmoura, como alguns núcleos japoneses faziam em São<br />

Paulo”.<br />

A geografia da mandioca é herança lusitana. O português balançando a<br />

mandioca para a África, Índia e Ásia. Luís da Câmara Cascudo:<br />

“O português adaptou-se serenamente às alimentações exóticas. No século<br />

XVI, a mandioca era a alimentação ameraba. Essa absorção imediata do alimento<br />

da terra é o que confere alto significado à mandioca, embora o português<br />

não se esqueça da culinária <strong>de</strong>le. Não esquece a culinária lusitana,<br />

mas inclui os quitutes, as esquisitices e refinamentos locais. Não o fazpor<br />

uma curiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> viajante ou necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> analista ou esfomeado, como<br />

por um instinto <strong>de</strong> solidarismo <strong>de</strong> paladar que é uma manifestação idêntica<br />

ao seu espírito curiosamente miscível e sempre típico.”<br />

168

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!