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Prosa - Academia Brasileira de Letras

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Cyl Gallindo<br />

afilado, cor preta e cabelo bom, cantava uma modinha toda à caipira. Comecei<br />

a prestar atenção à letra, que falava das estrelas do Brasil, e notei que<br />

era uma poesia sua”. O Mestre riu. Sorrindo disse que a modinha não era<br />

<strong>de</strong>le, mas da mestiça. Dele fora a poesia, a qual nos <strong>de</strong>clamou. Manuel Ban<strong>de</strong>ira<br />

também é cantado na Europa, nas Américas, no mundo inteiro.<br />

Somente em Pernambuco é on<strong>de</strong> ele é menos lembrado, quando não <strong>de</strong>sprezado.<br />

Não faz muito, a Câmara do Recife vetou a aposição <strong>de</strong> um busto<br />

seu em uma <strong>de</strong> nossas praças. “Para não abrir prece<strong>de</strong>ntes” – alegaram. Fosse<br />

ele um político, ou ao menos já tivesse sido, caberia essa alegação. Ainda<br />

assim, não caberia: conhecemos políticos com suas cabeças 10 mil vezes aumentadas,<br />

como cabeça <strong>de</strong> mosca em microscópio, e ninguém diz nada.<br />

Isso foi prejuízo para o povo. Manuel Ban<strong>de</strong>ira não necessitava <strong>de</strong>sse busto<br />

para ser da <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong>, nem para ser lembrado por milhares <strong>de</strong> brasileiros,<br />

que <strong>de</strong>le receberam os melhores ensinamentos, nem tampouco ainda para fazer<br />

poesia. Até certo ponto lhe era indigna essa homenagem: pois achamos,<br />

hoje em dia, não haver uma praça no Recife on<strong>de</strong> se possa erguer um busto a<br />

uma pessoa da envergadura <strong>de</strong> Manuel Ban<strong>de</strong>ira. Seria jogar uma obra preciosíssima<br />

ao relento. On<strong>de</strong> quer que se encontre a cultura, o espírito elevado,<br />

encontra-se o nome Manuel Ban<strong>de</strong>ira. O que as pessoas que lutaram pela<br />

aposição do busto queriam não era servir ao poeta, mas ao povo; a uma infinida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> pessoas que um dia, a espairecer numa praça, lhe visse o nome, a fisionomia<br />

e por aí sentisse a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ler a sua obra. Porém, o Mestre jamais<br />

se glorificaria disso. Como nunca se glorificou <strong>de</strong> tudo o que é feito por todo<br />

o Brasil. Para se compreen<strong>de</strong>r o quanto o poeta sente a insignificância <strong>de</strong>ssas<br />

coisas da vida, basta lembrar o verso on<strong>de</strong> ele expressa a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Morrer tão completamente<br />

que um dia ao lerem o nome num papel<br />

Perguntem: Quem foi?...<br />

Morrer mais completamente ainda:<br />

Sem <strong>de</strong>ixar sequer esse nome.<br />

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