Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
A travessia poética <strong>de</strong> Guimarães Rosa<br />
emas amorosos, <strong>de</strong>dicados à mulher inalcançável; estes, sem dúvida, os mais<br />
fracos do volume (“Tudo calado/ no jardim fechado.../Beija-me, querida,<br />
nesta noite fria,/ toda <strong>de</strong> alegria.../Não queres beijar-me?.../Queres ir embora?/Perdoa...<br />
Eu pensava/que gostasses <strong>de</strong> mim...”, pp. 84-5).<br />
Há, contudo, poemas <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> acerto, em que as camadas material e conceitual<br />
das palavras se harmonizam, trazendo, pelo ritmo obtido, sugestão plena<br />
<strong>de</strong> movimentação dos animais e pessoas. Tais os casos <strong>de</strong> “Boiada” (“– Boiada<br />
boa!.../Ancas cavadas,/costelas à mostra,/chifres pontudos <strong>de</strong> curraleiros,/tinir<br />
<strong>de</strong> argolas <strong>de</strong> bois carreiros,/ sol <strong>de</strong> fornalha... poeira vermelha...”, p.<br />
28) e “Batuque” (“A negrada dança,/ e nunca <strong>de</strong>scansa,/ no chão do terreiro,/<strong>de</strong><br />
pés no chão...”, p.104).<br />
Também há <strong>de</strong> se <strong>de</strong>stacar a precisão <strong>de</strong> algumas metáforas visuais, marca,<br />
aliás, do autor, ao longo da sua obra. Em Magma, algumas <strong>de</strong>las se apresentam<br />
logo no começo (“Bem abaixo das colinas <strong>de</strong> ondas ver<strong>de</strong>s,/on<strong>de</strong> o sol se refrata<br />
em agulhas frias”) e também no final (“O monte agachado e cinzento/é<br />
um elefante <strong>de</strong> pedra.”, p. 128); ou ainda: “Floresce, na orilha da campina,/esguio<br />
ipê/ <strong>de</strong> copa metálica e esterlina”.<br />
Do ponto <strong>de</strong> vista formal, todas as composições se encontram vazadas<br />
em versos livres, ocasionalmente rimados. Voltadas para a paisagem em<br />
torno, muitas são <strong>de</strong>scritivas; outras, narrativas, com o emprego até <strong>de</strong> diálogos<br />
entre personagens, como po<strong>de</strong>mos verificar nos poemas “Boiada”, já<br />
mencionado, e “Maleita”, que se tornaria embrião do conto “Sarapalha”,<br />
<strong>de</strong> Sagarana.<br />
Quanto à extensão, há textos curtos, <strong>de</strong> três versos, como a série <strong>de</strong> nove haicais,<br />
que giram em torno <strong>de</strong> 17 sílabas, ao lado <strong>de</strong> 15 outros poemas, também<br />
<strong>de</strong> três versos, <strong>de</strong> medida variável, e alguns <strong>de</strong> maior extensão, como “Ritmos<br />
selvagens”, com quase 90 versos.<br />
Dois exemplos <strong>de</strong> haicais e um poema curto:<br />
237