Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
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tempo. A criança já estava nua, apenas com um pedaço <strong>de</strong> tecido que lhe<br />
fora atado à boca para silenciar os seus gritos, e pendia da forca pelos tornozelos.<br />
Junto <strong>de</strong>le, também pendurado pelos tornozelos, estava um corpo<br />
pálido e magro que parecia muito branco à luz das chamas. Simplesmente,<br />
a garganta do cadáver tinha sido cortada quase até à coluna e todo o sangue<br />
do homem escorrera para o interior do Cal<strong>de</strong>irão, pingando ainda das<br />
pontas lisas e avermelhadas do longo cabelo <strong>de</strong> Gawain. O seu cabelo era<br />
tão comprido que as suas tranças ensanguentadas caíam <strong>de</strong>ntro do rebordo<br />
dourado do Cal<strong>de</strong>irão <strong>de</strong> prata <strong>de</strong> Clyddno Eiddyn, e foi apenas por esse<br />
cabelo comprido que eu percebi que era Gawain quem ali estava pendurado,<br />
uma vez que o seu belo rosto estava coberto <strong>de</strong> sangue, escondido pelo<br />
sangue, disfarçado pelo sangue.<br />
Merlim, ainda com a longa faca com que tinha matado Gawain na<br />
mão, parecia ter emu<strong>de</strong>cido com a nossa chegada. O seu olhar <strong>de</strong> alívio <strong>de</strong>saparecera<br />
e agora eu não conseguia <strong>de</strong> todo ler o que quer que fosse no seu<br />
rosto, mas Nimue guinchava connosco. Ergueu a palma da mão esquerda,<br />
a que tinha a cicatriz igual à da minha mão esquerda.<br />
— Mata Artur! — gritou-me ela. — Derfel! Tu prestaste-me juramento!<br />
Mata-o! Agora não po<strong>de</strong>mos parar!<br />
De repente, a lâmina <strong>de</strong> uma espada reluziu junto à minha barba. Era<br />
Galaad quem a empunhava, e ele sorria gentilmente para mim.<br />
— Não te mexas, meu amigo — disse ele. Ele conhecia o po<strong>de</strong>r dos<br />
juramentos, mas também sabia que eu não mataria Artur e tentava, por<br />
isso, poupar-me à vingança <strong>de</strong> Nimue. — Se Derfel se mexer — disse ele a<br />
Nimue — cortar-lhe-ei a goela.<br />
— Corta! — gritou ela. — Esta é uma noite pela morte dos fi lhos dos<br />
reis!<br />
— Não do meu fi lho — disse Artur.<br />
— Tu não és rei, Artur ap Uther. — Merlim falou por fi m. — Pensaste<br />
que eu iria matar Gwydre?<br />
— Então, porque está ele aqui? — perguntou Artur. Tinha um braço<br />
em volta <strong>de</strong> Gwydre, enquanto o outro segurava a sua espada ensanguentada.<br />
— Porque está ele aqui? — Artur voltou a perguntar, mais zangado.<br />
Pela primeira vez, Merlim nada tinha para dizer e foi Nimue quem<br />
respon<strong>de</strong>u.<br />
— Ele está aqui, Artur ap Uther — disse ela com um sorriso escarninho<br />
— porque a morte <strong>de</strong>ssa miserável criatura po<strong>de</strong> não ser sufi ciente. —<br />
E apontou para Mardoc que se torcia <strong>de</strong>sesperadamente na forca. — Ele é<br />
fi lho <strong>de</strong> um rei, mas não o her<strong>de</strong>iro legítimo.<br />
— Então Gwydre teria morrido? — perguntou Artur.<br />
— E voltado à vida! — disse Nimue <strong>de</strong> forma beligerante. Ela tinha<br />
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