Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
ela chorava, apesar da sua ira. — Mas foi tudo o que Artur sempre quis que<br />
eu fosse! Uma vaca pari<strong>de</strong>ira!<br />
— Não, senhora — respondi.<br />
Ela virou-se para mim enraivecida e com os olhos a brilharem com<br />
lágrimas.<br />
— Sabes mais do que eu sobre isto, Derfel?<br />
— Ele tinha orgulho em vós, senhora — afi rmei acanhadamente. —<br />
Ele rejubilava com a vossa beleza.<br />
— Ele podia ter feito uma estátua minha se era tudo o que queria!<br />
Uma estátua com canais <strong>de</strong> leite on<strong>de</strong> podia amontoar os seus infantes!<br />
— Ele amava-vos — protestei.<br />
Ela olhou-me fi xamente e eu pensei que fosse irromper num acesso <strong>de</strong><br />
cólera, mas em vez disso sorriu tristemente.<br />
— Ele venerava-me, Derfel — disse ela enfastiada — e isso não é a<br />
mesma coisa que estar apaixonado. — Ela sentou-se <strong>de</strong> repente, caindo<br />
num banco colocado junto à arca <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira. — E ser venerada, Derfel, é<br />
muito cansativo. Mas agora parece ter encontrado uma nova <strong>de</strong>usa.<br />
— Ele fez o quê, senhora?<br />
— Não sabias? — Ela pareceu surpreendida, <strong>de</strong>pois agarrou na carta<br />
com um puxão. — Toma, lê.<br />
Tomei o pergaminho da sua mão. Não tinha data, apenas o en<strong>de</strong>reço<br />
Moridunum, mostrando que havia sido escrita na capital <strong>de</strong> Oengus mac<br />
Airem. A carta estava redigida com a letra fi rme <strong>de</strong> Artur e era tão fria<br />
como a neve espessa sobre o peitoril da janela. «Deveis saber, senhora» escrevera<br />
ele, «que renuncio a vós como minha esposa e tomo Argante, fi lha<br />
<strong>de</strong> Oengus mac Airem no vosso lugar. Não renuncio a Gwydre, apenas a<br />
vós.» Era tudo. Nem tão-pouco estava assinada.<br />
— Não sabias mesmo? — perguntou-me Guinevere.<br />
— Não, senhora — afi rmei.<br />
Eu estava muito mais admirado do que Guinevere. Ouvira dizer aos<br />
homens que Artur <strong>de</strong>via tomar outra mulher, mas ele nada me dissera e<br />
senti-me ofendido por ele não ter confi ado em mim. Senti-me ofendido e<br />
<strong>de</strong>siludido.<br />
— Eu não sabia — insisti.<br />
— Alguém abriu a carta — disse Guinevere num divertimento perverso.<br />
— Po<strong>de</strong>s ver que <strong>de</strong>ixaram uma mancha <strong>de</strong> sujida<strong>de</strong> na parte inferior da<br />
folha. Artur não o teria feito. — Ela recostou-se <strong>de</strong> tal modo que o seu cabelo<br />
ruivo solto fi cou esmagado contra a pare<strong>de</strong>. — Porque vai ele casar-se?<br />
— perguntou ela.<br />
Encolhi os ombros.<br />
— Um homem <strong>de</strong>ve ser casado, senhora.<br />
125