Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
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homens diziam que os Saxões eram o seu castigo. Até mesmo o tempo pressagiava<br />
infortúnio porque, na manhã seguinte à minha separação <strong>de</strong> Artur,<br />
começou a chover e parecia que essa chuva não mais iria parar. Os dias<br />
que se seguiram trouxeram nuvens cinzentas baixas, um vento gelado, e<br />
uma chuva persistente. Tudo estava molhado. As nossas roupas, as nossas<br />
camas, a nossa lenha, todas as pare<strong>de</strong>s das nossas casas pareciam untadas<br />
por causa da humida<strong>de</strong>. As lanças enferrujavam nos seus armeiros, os cereais<br />
armazenados germinavam ou fi cavam bolorentos, e ainda assim a chuva<br />
fustigava implacavelmente <strong>de</strong> oeste. Ceinwyn e eu fi zemos os possíveis<br />
por vedar o palácio <strong>de</strong> Dun Caric. O irmão <strong>de</strong>la presenteou-a com peles<br />
<strong>de</strong> lobo que trouxera <strong>de</strong> Powys e nós usámo-las para forrar as pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
ma<strong>de</strong>ira, mas o próprio ar por baixo das vigas do telhado parecia encharcado.<br />
Fogueiras ardiam com aspeto lúgubre dando-nos <strong>de</strong> má vonta<strong>de</strong> um<br />
calor intermitente e fuliginoso que ruborescia os nossos olhos. As nossas<br />
duas fi lhas estavam intratáveis no início <strong>de</strong>sse inverno. Morwenna, a mais<br />
velha, que normalmente era a mais plácida e bem-disposta das crianças,<br />
tornou-se violenta e tão insistentemente egoísta que Ceinwyn chegou a<br />
bater-lhe com o cinto.<br />
— Ela tem sauda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Gwydre — disse-me Ceinwyn ao cabo <strong>de</strong> algum<br />
tempo.<br />
Artur or<strong>de</strong>nara que Gwydre não saísse <strong>de</strong> ao pé <strong>de</strong> si, por isso o rapaz<br />
havia partido com o seu pai para se encontrarem com o rei Meurig.<br />
— Eles <strong>de</strong>vem casar-se no próximo ano — acrescentou Ceinwyn. —<br />
Isso curá-la-á.<br />
— Se Artur <strong>de</strong>ixar que Gwydre case com ela — respondi, sombriamente.<br />
— Nos tempos que correm, ele não sente gran<strong>de</strong> afeto por nós. —<br />
Eu quis acompanhar Artur a Gwent, mas ele recusou-se perentoriamente.<br />
Houve uma época em que eu próprio pensei ser o seu melhor amigo, mas<br />
agora ele resmungava quando me via, em vez <strong>de</strong> me acolher com prazer. —<br />
Ele pensa que eu pus em risco a vida <strong>de</strong> Gwydre — afi rmei.<br />
— Não — discordou Ceinwyn. — Ele tem sido distante contigo <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
a noite em que <strong>de</strong>scobriu Guinevere.<br />
— Porque é que isso haveria <strong>de</strong> mudar as coisas?<br />
— Porque tu estavas com ele, meu querido — disse Ceinwyn, pacientemente<br />
— e contigo ele não po<strong>de</strong> fi ngir que nada mudou. Tu foste uma<br />
testemunha da sua vergonha. Ele vê-te e recorda-se <strong>de</strong>la. Ele também tem<br />
ciúmes.<br />
— Ciúmes?<br />
Ela sorriu.<br />
— Ele acha que tu és feliz. Agora, pensa que se tivesse casado comigo,<br />
também seria feliz.<br />
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