Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Não havia nele nada <strong>de</strong> mágico, exceto o facto <strong>de</strong> ser belo. Era esta a<br />
palavra que mais se lhe a<strong>de</strong>quava. Num mundo <strong>de</strong> membros retorcidos,<br />
pernas mancas, pescoços com papeira, rostos com cicatrizes e almas enfastiadas,<br />
este guerreiro era belo. Era alto, <strong>de</strong>lgado e <strong>de</strong> cabelo dourado, e tinha<br />
um rosto sereno que apenas podia ser <strong>de</strong>scrito como simpático, até mesmo<br />
afável. Os seus olhos eram <strong>de</strong> um azul surpreen<strong>de</strong>nte. Não trazia elmo,<br />
por isso o seu cabelo, tão longo como o <strong>de</strong> uma rapariga, caía abaixo dos<br />
seus ombros. Tinha uma couraça branca, caneleiras brancas e uma bainha<br />
branca. O ornamento <strong>de</strong> guerra parecia dispendioso e questionei-me quem<br />
seria ele. Pensara eu que conhecia a maior parte dos guerreiros da Bretanha<br />
— pelo menos aqueles que podiam comprar armaduras como a <strong>de</strong>ste<br />
jovem — mas eu <strong>de</strong>sconhecia-o. Sorriu para a multidão, <strong>de</strong>pois ergueu as<br />
duas mãos e fez-lhes sinal para que se ajoelhassem.<br />
Issa e eu permanecemos <strong>de</strong> pé. Talvez fosse a nossa arrogância <strong>de</strong><br />
guerreiros, ou talvez apenas quiséssemos ver por entre as cabeças que se<br />
interpunham.<br />
O guerreiro <strong>de</strong> cabelos longos nada disse, mas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> a multidão se<br />
ter ajoelhado, agra<strong>de</strong>ceu-lhes sorrindo e então caminhou em volta da arcada<br />
apagando as tochas, retirando-as das suas aselhas e mergulhando-as em<br />
barris cheios <strong>de</strong> água que ali estavam para o efeito. Era, conforme percebi,<br />
uma representação que fora cuidadosamente ensaiada. O pátio fi cou cada<br />
vez mais escuro até ser apenas iluminado pelas duas tochas que la<strong>de</strong>avam<br />
a gran<strong>de</strong> porta do palácio. Havia pouco luar e a noite estava muito escura<br />
e fria.<br />
O guerreiro branco <strong>de</strong>teve-se entre as duas últimas tochas.<br />
— Filhos da Bretanha — disse ele, e a sua voz igualava a sua beleza,<br />
uma voz afável, cheia <strong>de</strong> vivacida<strong>de</strong> — orai aos vossos Deuses! No interior<br />
<strong>de</strong>stes muros estão os Tesouros da Bretanha e em breve, muito em breve,<br />
o seu po<strong>de</strong>r será liberto, mas agora, para que possais ver o seu po<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>ixaremos<br />
que os Deuses nos falem. — Com estas palavras apagou as duas<br />
últimas tochas e <strong>de</strong> repente o pátio fi cou às escuras.<br />
Nada aconteceu. A multidão resmoneou, pedindo a Bel, Gofannon,<br />
Grannos e Don que mostrassem o seu po<strong>de</strong>r. Senti um formigueiro na pele<br />
e agarrei no copo <strong>de</strong> Hywelbane. Ro<strong>de</strong>ar-nos-iam os Deuses? Levantei os<br />
olhos para o sítio on<strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> estrelas cintilava por entre as nuvens<br />
e imaginei os Deuses supremos a pairarem nessa camada superior da<br />
atmosfera, e então Issa sobressaltou-se e eu <strong>de</strong>sviei o olhar das estrelas.<br />
Também eu fi quei sem fôlego.<br />
Porque uma rapariga, pouco mais do que uma criança prestes a<br />
tornar-se mulher, aparecera na escuridão. Era uma rapariga <strong>de</strong>licada, <strong>de</strong><br />
uma juventu<strong>de</strong> sedutora e uma beleza graciosa, e estava nua como um<br />
24