Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
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simples cota com evi<strong>de</strong>ntes adornos <strong>de</strong> ferro pintados com leite <strong>de</strong> cal. Não<br />
fora a sua segurança e a sua inegável beleza e ele seria ridículo.<br />
— Então, o que tens feito <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a última vez que nos vimos? — perguntou-me<br />
Merlim, e foi nessa altura que eu lhe contei o que suce<strong>de</strong>ra a<br />
Guinevere e ele zombou da minha convicção <strong>de</strong> que ela fi caria encarcerada<br />
para o resto da sua vida. — Artur é um tolo — insistiu ele. — Guinevere<br />
po<strong>de</strong> ser esperta, mas ele não precisa <strong>de</strong>la. Ele precisa <strong>de</strong> uma qualquer,<br />
honesta e estúpida, alguém que lhe mantenha a cama quente enquanto ele<br />
se preocupa com os Saxões. — Sentou-se no sofá e sorriu enquanto as duas<br />
crianças que haviam transportado o Cal<strong>de</strong>irão para o pátio lhe traziam um<br />
prato com pão e queijo e uma garrafa <strong>de</strong> hidromel. — A ceia! — disse ele,<br />
feliz. — Faz-me companhia, Derfel, pois queremos falar contigo. Senta-te!<br />
Acharás o chão bastante confortável. Senta-te ao lado <strong>de</strong> Nimue.<br />
Sentei-me. Até aí Nimue havia-me ignorado. A cavida<strong>de</strong> do seu olho<br />
perdido, que lhe fora arrancado do rosto por um rei, estava coberta por<br />
uma pala, e o seu cabelo, que fora cortado rente antes <strong>de</strong> irmos para sul,<br />
para o palácio do mar <strong>de</strong> Guinevere, voltara a crescer, embora estivesse<br />
ainda sufi cientemente curto para lhe dar uma aparência arrapazada. Ela<br />
parecia zangada, mas era como Nimue sempre parecia. A sua vida era votada<br />
apenas a uma coisa, a busca dos Deuses, e <strong>de</strong>sprezava tudo o que<br />
a <strong>de</strong>sviasse <strong>de</strong>ssa busca. Talvez ela pensasse que os gracejos irónicos <strong>de</strong><br />
Merlim eram <strong>de</strong> algum modo uma perda <strong>de</strong> tempo. Ela e eu havíamos<br />
crescido juntos e nos anos que se seguiram à nossa meninice, mais <strong>de</strong> uma<br />
vez a sustentei, alimentando-a e vestindo-a, apesar <strong>de</strong> me tratar como se<br />
eu fosse um tolo.<br />
— Quem governa a Bretanha? — perguntou-me ela, abruptamente.<br />
— Pergunta errada! — disse-lhe Merlim, secamente, com uma veemência<br />
inesperada. — Pergunta errada!<br />
— Então? — exigiu-me ela uma resposta, ignorando a irritação <strong>de</strong><br />
Merlim.<br />
— Ninguém governa a Bretanha — respondi-lhe.<br />
— Resposta certa — disse Merlim vingativo. O seu mau génio perturbara<br />
Gawain, que estava <strong>de</strong> pé por trás do sofá <strong>de</strong> Merlim e olhava ansiosamente<br />
para Nimue. Ele estava com medo <strong>de</strong>la, mas não posso censurá-lo<br />
por isso. Nimue assustava a maior parte das pessoas.<br />
— Então, quem governa Dumnónia? — perguntou-me ela.<br />
— É Artur — respondi-lhe.<br />
Nimue lançou a Merlim um olhar triunfante, mas o druida limitou-se<br />
a abanar a cabeça.<br />
— A palavra é rex — disse ele — rex, e se algum <strong>de</strong> vocês tivesse a<br />
mais pequena noção <strong>de</strong> latim, saberia que rex signifi ca rei, não imperador.<br />
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