Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
agora não consegue usá-lo. Por isso dá-o à tua princesa <strong>de</strong> Powys. Ouvi<br />
dizer que ela é uma boa esposa?<br />
— É sim, meu Rei e Senhor.<br />
— Dá-lho — or<strong>de</strong>nou-me Aelle — e diz-lhe que se os nossos países<br />
se <strong>de</strong>frontarem na guerra, eu pouparei a mulher que usar este anel, poupá-la-ei<br />
a ela e à sua família.<br />
— Obrigado, meu Rei e Senhor — disse eu, e coloquei o pequeno anel<br />
na minha bolsa.<br />
— Tenho uma última coisa para te dar — disse-me ele e colocou um<br />
braço em volta dos meus ombros, levando-me até junto da pedra. Sentia-me<br />
culpado por não lhe ter levado nenhuma oferenda; <strong>de</strong> facto, com medo <strong>de</strong><br />
vir a Lloegyr, a i<strong>de</strong>ia nem tão-pouco me ocorreu, mas Aelle <strong>de</strong>ixou passar<br />
a minha falha. Deteve-se junto ao bloco <strong>de</strong> pedra arredondada. — Outrora<br />
esta pedra pertenceu aos Bretões — afi rmou — e para eles ela era sagrada.<br />
Tem um buraco, vês? Chega-te para o lado, rapaz, olha.<br />
Caminhei para o lado da pedra e vi que, <strong>de</strong> facto, existia um enorme<br />
buraco negro que se dirigia para o seu centro.<br />
— Certa vez falei com um velho escravo britânico — confessou-me<br />
Aelle — e ele disse-me que se sussurrarmos para o interior do buraco, conseguimos<br />
falar com os mortos.<br />
— Mas vós não acreditais nisso? — perguntei-lhe, tendo percebido<br />
ceticismo na sua voz.<br />
— Nós acreditamos que po<strong>de</strong>mos falar com Th unor, Wo<strong>de</strong>n e Seaxnet<br />
através <strong>de</strong>ste buraco — disse Aelle — mas, e tu? Talvez consigas chegar aos<br />
mortos, Derfel. — Ele sorriu. — Havemos <strong>de</strong> nos encontrar <strong>de</strong> novo, rapaz.<br />
— Assim o espero, meu Rei e Senhor — respondi-lhe, e <strong>de</strong>pois lembrei-me<br />
da estranha profecia da minha mãe, <strong>de</strong> que Aelle seria morto pelo<br />
seu fi lho, e tentei afastá-la como fazendo parte dos <strong>de</strong>lírios <strong>de</strong> uma mulher<br />
velha e louca; mas os Deuses escolhem muitas vezes essas mulheres para<br />
suas porta-vozes e <strong>de</strong> repente fi quei sem palavras.<br />
Aelle abraçou-me, apertando o meu rosto contra a gola da sua gran<strong>de</strong><br />
capa <strong>de</strong> pelo.<br />
— Tem a tua mãe ainda muito tempo <strong>de</strong> vida? — perguntou-me.<br />
— Não, meu Rei e Senhor.<br />
— Enterra-a — disse-me ele — com os pés para norte. É um costume<br />
da nossa gente. — Deu-me um último abraço. — Serás levado a casa em segurança<br />
— afi rmou, <strong>de</strong>pois recuou. — Para falar aos mortos — acrescentou<br />
bruscamente — tens <strong>de</strong> dar três voltas à pedra, <strong>de</strong>pois ajoelhares-te diante<br />
do buraco. Dá um beijo às minhas netas por mim. — Sorriu, satisfeito por<br />
me ter surpreendido com a revelação <strong>de</strong> tão íntimo conhecimento da minha<br />
vida. Depois virou-se e afastou-se.<br />
69