Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Tradução de Ana Faria e Marta Couceiro
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
nónia. Toda a fera era garras, cauda e fogo. — É, sem dúvida, o estandarte<br />
da Dumnónia — confessou Gawain — mas não creio que os outros reis<br />
britânicos se importem, não achais?<br />
— Não, se levar<strong>de</strong>s os Sais para o mar — disse eu.<br />
— Essa é a minha tarefa, senhor — disse Gawain com gran<strong>de</strong> solenida<strong>de</strong>.<br />
— Com a ajuda dos Deuses, claro, e disto. — Tocou em Excalibur que<br />
estava ainda <strong>de</strong>baixo do meu braço.<br />
— Excalibur! — Pareci surpreendido, uma vez que não conseguia<br />
imaginar homem nenhum sem ser Artur a empunhar a espada mágica.<br />
— Que mais? — perguntou-me Gawain. — Devo empunhar Excalibur,<br />
montar Anbarr e expulsar o inimigo da Bretanha. — Sorriu satisfeito,<br />
<strong>de</strong>pois indicou um gesto para um banco que se encontrava junto à porta do<br />
templo. — Se esperar<strong>de</strong>s, senhor, irei à procura <strong>de</strong> Merlim.<br />
O templo era guardado por seis lanceiros Escudos Negros, mas uma<br />
vez que eu tinha ido até ali na companhia <strong>de</strong> Gawain, eles nem tentaram<br />
<strong>de</strong>ter-me quando me curvei para passar sob o baixo lintel da entrada. Não<br />
explorei o pequeno edifício por mera curiosida<strong>de</strong>, mas porque, naquela<br />
época, Mitras era o meu principal Deus. Ele era o Deus dos soldados, o<br />
Deus secreto. Haviam sido os Romanos quem introduzira o seu culto na<br />
Bretanha e, apesar <strong>de</strong> já há muito terem partido, Mitras era ainda um dos<br />
Deuses favoritos da maioria dos guerreiros. Este templo era minúsculo,<br />
apenas com duas pequenas salas sem janelas imitando a gruta on<strong>de</strong> Mitras<br />
nascera. A sala exterior estava cheia <strong>de</strong> caixas <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira e cestos <strong>de</strong> vime<br />
que, suspeitei, continham os Tesouros da Bretanha, embora não tivesse levantado<br />
nenhuma das tampas para me certifi car. Em vez disso, baixei-me<br />
para passar pela porta interior que dava acesso ao escuro santuário e nele<br />
encontrei, tremeluzindo, o gran<strong>de</strong> Cal<strong>de</strong>irão <strong>de</strong> ouro e prata <strong>de</strong> Clyddno<br />
Eiddyn. Para além do Cal<strong>de</strong>irão, e apenas vislumbrando-se à escassa luz<br />
acinzentada que penetrava pelas duas portas baixas, encontrava-se também<br />
o altar <strong>de</strong> Mitras. Merlim ou Nimue, ambos ridicularizavam Mitras, havia<br />
colocado um crânio <strong>de</strong> texugo no altar para <strong>de</strong>sviar a atenção dos Deuses.<br />
Afastei o crânio com uma palmada, e ajoelhei-me ao lado do Cal<strong>de</strong>irão, rezando.<br />
Pedi a Mitras que ajudasse os nossos outros Deuses e rezei também<br />
para que ele viesse a Mai Dun e emprestasse o seu terror para matar os nossos<br />
inimigos. Toquei com o copo <strong>de</strong> Excalibur na sua pedra e questionei-me<br />
sobre a última vez que um touro ali fora sacrifi cado. Imaginei os soldados<br />
romanos forçando o touro a ajoelhar-se, <strong>de</strong>pois empurrando-lhe as ancas<br />
e puxando os chifres para o fazer passar pelas portas baixas até, uma vez<br />
no santuário interior, se levantar e mugir com medo, cheirando-lhe apenas<br />
a inúmeros lanceiros na escuridão. E aí, na escuridão aterradora, ele seria<br />
estropiado pelo corte dos tendões da parte <strong>de</strong> trás dos joelhos. Mugiria <strong>de</strong><br />
78