José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
— Não venhas me dizer que estás com vergonha <strong>de</strong> te <strong>de</strong>spires perto <strong>de</strong> mim.<br />
— Não. Não é isso...<br />
Não tinha outra alternativa; virei-me <strong>de</strong> costas e comecei a tirar a roupa.<br />
Primeiro a camisa, <strong>de</strong>pois as calças com os suspensórios <strong>de</strong> pano.<br />
Joguei tudo no chão e virei-me súplice para ele. Realmente não disse nada<br />
mas tinha o horror e a <strong>rev</strong>olta estampados nos olhos. Eu não queria que ele visse as<br />
manchas, os vergões e as cicatrizes das surras que eu tinha apanhado.<br />
Apenas murmurou emocionado...<br />
— Se te dói, não entra n'água.<br />
— Agora não dói mais.<br />
Comemos ovos, banana, salame, pão e mariolas. Isso só eu quem gostava.<br />
Fomos beber água no rio e voltamos para <strong>de</strong>baixo da Rainha Carlota.<br />
Ele já ia se sentar, mas fiz sinal que parasse. Coloquei a mão no peito e<br />
<strong>rev</strong>erenciei a árvore.<br />
— Majesta<strong>de</strong>, seu súdito o cavalheiro Manuel Valadares e o maior Guerreiro<br />
da Nação Pinagé... Nós vamos sentar <strong>de</strong>baixo da Senhora.<br />
Rimos e nos sentamos.<br />
O Portuga esten<strong>de</strong>u-se no chão, forrou com o colete uma raiz da árvore e<br />
falou:<br />
— Agora, toca a tirar uma soneca.<br />
— Mas eu não estou com vonta<strong>de</strong>.<br />
— Não importa. Não vou te <strong>de</strong>ixar solto por aí, peralta como és.<br />
Passou a mão sobre o meu peito e me fez prisioneiro. Ficamos um tempão<br />
olhando as nuvens escaparem por entre os galhos da árvore. Tinha chegado o<br />
momento. Se eu não falasse agora, nunca mais o faria.<br />
— Portuga!<br />
— Hum...<br />
— Você está dormindo?<br />
— Ainda não.<br />
— É verda<strong>de</strong> aquilo que você disse a seu Ladislau, na Confeitaria?<br />
— Ora, tantas coisas eu tenho dito a seu Ladislau, na Confeitaria.<br />
— A meu respeito. Eu ouvi. Do carro eu ouvi.<br />
— E o que ouviste?<br />
— Que você gosta muito <strong>de</strong> mim?<br />
— Está claro que gosto <strong>de</strong> ti. Que diferença faz?<br />
Aí eu me virei, sem me libertar dos seus braços. Fitei os seus olhos<br />
semicerrados. Seu rosto assim ficava mais gordo e mais parecido com um rei.<br />
— Não, mas eu quero saber com força se você gosta mesmo <strong>de</strong> mim?<br />
— Claro, bobinho.<br />
E me apertou mais para comprovar o que dissera.<br />
100