José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
— Dona, meu trabalho não tem nada <strong>de</strong> imoral. Qualquer trabalho honesto é<br />
trabalho e eu não me envergonho, sabe?<br />
Nunca vi seu Ariovaldo tão encrespado. Ela queria briga, então pronto.<br />
— Essa criança é seu filho?<br />
— Não senhora, infelizmente.<br />
— Seu sobrinho, seu parente?<br />
— Nada <strong>de</strong> meu.<br />
— Que ida<strong>de</strong> tem?<br />
— Seis anos.<br />
Ela duvidou olhando o meu tamanho. Mas continuou.<br />
— O senhor não tem vergonha <strong>de</strong> explorar uma criancinha?<br />
— Não estou explorando coisa nenhuma, dona. Ele canta comigo porque<br />
quer e gosta, viu? Depois eu pago a ele, não pago?<br />
Fiz sim com a cabeça. Eu estava achando danado <strong>de</strong> bom a briga. Minha<br />
vonta<strong>de</strong> era dar uma cabeçada na barriga <strong>de</strong>la e ver o barulho no chão. Bum!<br />
— Pois fique sabendo que eu vou tomar providências. Vou falar com o<br />
Senhor Padre. Vou falar com o Juizado <strong>de</strong> Menores. Vou até à Polícia.<br />
Aí ela calou a boca e arregalou os olhos amedrontada. Seu<br />
Ariovaldo tinha puxado aquela faca enorme e chegado perto <strong>de</strong>la. Via a hora<br />
<strong>de</strong> ela ter um faniquito.<br />
— Pois, vá, dona. Mas vá logo. Eu sou muito bom mas tenho a mania <strong>de</strong><br />
cortar língua <strong>de</strong> bruxa fala<strong>de</strong>ira que se mete na vida alheia...<br />
Ela saiu dura como uma vassoura e longe virou-se e apontou a sombrinha!...<br />
— O senhor vai ver só!...<br />
— Desapareça sua Bruxa <strong>de</strong> Croxóxó!...<br />
Ela abriu a sombrinha e foi sumindo na rua, toda durinha da vida.<br />
* * *<br />
De tardinha, seu Ariovaldo contava o lucro.<br />
— Foi tudo, Zezé. Você tinha razão. Você me dá sorte.<br />
Me lembrei <strong>de</strong> Dona Maria da Penha.<br />
— E ela vai fazer alguma coisa?<br />
— Vai nada, Zezé. O máximo é conversar com o padre e o padre vai<br />
aconselhar:<br />
— É melhor <strong>de</strong>ixar, Dona Maria. Essa gente do Norte não é <strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>ira.<br />
Meteu o dinheiro no bolso e enrolou a sacola.<br />
Depois, como sempre fazia, meteu a mão no bolso das calças e apanhou um<br />
folheto dobrado.<br />
— Esse é <strong>de</strong> sua irmãzinha Glória.<br />
57