José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
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Junto à Confeitaria, <strong>de</strong>fronte à Estação, estava o carrão lindo parado. Nasceu<br />
o primeiro raio <strong>de</strong> sol <strong>de</strong> alegria. <strong>Meu</strong> coração se adiantou na frente cavalgando a<br />
minha sauda<strong>de</strong>. Ia ver o meu amigo mesmo.<br />
Mas nesse momento um apito lindo que me <strong>de</strong>ixou todo arrepiado ecoou na<br />
entrada da Estação. Era o Mangaratiba. Violento, orgulhoso, dono <strong>de</strong> todos os<br />
trilhos. Passou voando, chacoalhando os vagões naquela lin<strong>de</strong>za toda. As pessoas<br />
das janelinhas olhavam para fora. Todo mundo que viajava era feliz. Quando era<br />
criança gostava <strong>de</strong> ficar vendo o Mangaratiba passar e dar a<strong>de</strong>us que não acabava<br />
mais. A<strong>de</strong>us até o trem sumir no fim da linha. Hoje quem estava nessa fase era<br />
Luís.<br />
Procurei entre as mesas da Confeitaria e lá estava ele. Na última mesa para<br />
po<strong>de</strong>r ver quando os fregueses chegavam.<br />
Estava <strong>de</strong> costas, sem paletó e com o lindo colete <strong>de</strong> xadrezinho, <strong>de</strong>ixando<br />
escapar as mangas alvas da camisa limpa.<br />
Foi me dando uma fraqueza tão gran<strong>de</strong> que mal eu consegui chegar perto <strong>de</strong><br />
suas costas. Quem <strong>de</strong>u o alarme foi seu Ladislau.<br />
— Espia, Portuga, quem está aí.<br />
Ele virou-se <strong>de</strong>vagar e abriu o rosto num sorriso <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong>. Abriu os<br />
braços e me apertou <strong>de</strong>moradamente.<br />
— <strong>Meu</strong> coração estava me dizendo que tu virias hoje. Depois me olhou um<br />
certo tempo.<br />
— Então, fujão. On<strong>de</strong> estiveste esse tempo todo?<br />
— Estive muito doente.<br />
Puxou a ca<strong>de</strong>ira.<br />
— Senta-te.<br />
Estalou o <strong>de</strong>do chamando o garçom que já sabia o que eu gostava. Mas<br />
quando <strong>de</strong>positou o refresco e o doce, eu nem os toquei. Apoiei a cabeça sobre os<br />
braços e fiquei assim, me sentindo amolecido e triste.<br />
— Não queres?<br />
E como não respon<strong>de</strong>sse, o Portuga suspen<strong>de</strong>u o meu rosto. Eu mordia os<br />
lábios com força e meus olhos estavam inundados.<br />
— Ora o que é isso, Pirralho? Conta cá para o teu amigo...<br />
— Não posso. Aqui não posso...<br />
Seu Ladislau estava balançando a cabeça negativamente como se não<br />
compreen<strong>de</strong>sse. Resolvi falar uma coisa.<br />
— Portuga, é verda<strong>de</strong> que o carro ainda é “nosso” carro?<br />
— É. Ainda tens dúvida?<br />
— Você seria capaz <strong>de</strong> me levar para dar um passeio?<br />
Ele se espantou com o pedido.<br />
— Se queres, vamos já.<br />
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