José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
CAPITULO QUARTO<br />
Duas surras memoráveis<br />
— VOCÊ DOBRA AQUI. Agora corta com a faca o papel bem na dobra.<br />
O ruído macio do gume da faca dividindo o papel.<br />
— Agora cole bem <strong>de</strong> fininho <strong>de</strong>ixando essa margem. Assim.<br />
Eu estava ao lado <strong>de</strong> Totóca apren<strong>de</strong>ndo a fazer um balão. Depois <strong>de</strong> tudo<br />
colado, Totóca pren<strong>de</strong>u o balão pelo bico <strong>de</strong> cima, com um pregador <strong>de</strong> roupa, no<br />
varal.<br />
— Só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> bem seco que a gente faz a boca. Apren<strong>de</strong>u, seu burrinho?<br />
— Aprendi.<br />
Ficamos sentados na soleira da porta da cozinha espiando o balão colorido<br />
que custava a secar. Aí Totóca enfronhado na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mestre ia explicando:<br />
— Balão-tangerina a gente só <strong>de</strong>ve fazer <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> muita prática; no começo<br />
você <strong>de</strong>ve fazer <strong>de</strong> dois gomos que é mais fácil.<br />
— Totóca, se eu fizer um balão sozinho, você bota a boca pra mim?<br />
— Depen<strong>de</strong>.<br />
Lá estava ele querendo fazer negócios. Avançar nas minhas bolas <strong>de</strong> gu<strong>de</strong> ou<br />
na minha colação <strong>de</strong> figurinhas <strong>de</strong> artista <strong>de</strong> cinema que “ninguém compreendia<br />
como crescia tanto”.<br />
— Puxa, Totóca, quando você me pe<strong>de</strong>, eu até brigo por você.<br />
— Está bem. A primeira eu faço <strong>de</strong> graça e se você não apren<strong>de</strong>r, as outras<br />
só na base da troca.<br />
— Está certo.<br />
Naquele momento eu tinha jurado comigo mesmo que ia apren<strong>de</strong>r tanto, que<br />
nunca mais ele iria botar as mãos nos meus balões.<br />
Aí o meu balão não me saiu mais da idéia. Tinha que ser o “meu” balão.<br />
Imagine o orgulho do Portuga quando eu contasse a proeza. A admiração <strong>de</strong><br />
Xururuca quando visse o bicho balançando em minhas mãos...<br />
Dominado pela idéia, enchi os bolsos <strong>de</strong> bolas <strong>de</strong> gu<strong>de</strong> e algumas figurinhas<br />
repetidas e ganhei o mundo da rua. Ia ven<strong>de</strong>r bola <strong>de</strong> gu<strong>de</strong> e figurinhas o mais<br />
barato possível para po<strong>de</strong>r comprar pelo menos duas folhas <strong>de</strong> papel <strong>de</strong> seda.<br />
— Vamos, minha gente! Cinco bolas por um tostão. Novinhas como se<br />
viessem da loja!<br />
E nada.<br />
83