José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
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— E eu? Custou tanto para fazer você ficar do jeito que eu queria.<br />
<strong>Meu</strong>s olhos ficaram covar<strong>de</strong>mente cheios <strong>de</strong> lágrimas.<br />
— Mas tu <strong>de</strong>ves admitir que às vezes a gente também possa sonhar.<br />
— É que você não me botou no seu sonho.<br />
Ele sorriu embevecido.<br />
— Tudo que é sonho meu, Portuga, eu boto você. Quando saio pelas ver<strong>de</strong>s<br />
campinas com Tom Mix e Fred Thompson, já aluguei uma diligência para você<br />
viajar e não se cansar muito. Você está em todo canto que eu vou. De vez em<br />
quando, na aula, eu olho pra porta e penso que você chega lá e me dá a<strong>de</strong>us...<br />
— Santo Deus! Nunca vi uma alminha tão se<strong>de</strong>nta <strong>de</strong> ternura como tu. Mas<br />
não <strong>de</strong>vias te apegar tanto a mim, sabes?...<br />
* * *<br />
Era isso que eu estava contando para Minguinho. Minguinho era pior do que<br />
eu para gostar <strong>de</strong> conversar.<br />
— Mas a verda<strong>de</strong>, Xururuca, é que <strong>de</strong>pois que ele ficou, meu pai ficou todo<br />
coruja. Tudo que eu faço, ele acha bonito. Mas acha bonito diferente. Não é como<br />
os outros que falam: esse menino vai longe. Vai longe mas a gente nunca sai <strong>de</strong><br />
Bangu.<br />
Olhei Minguinho com ternura. Agora que <strong>de</strong>scobrira mesmo o que era<br />
ternura, em tudo que eu gostava colava ternura.<br />
— Olhe, Minguinho, eu quero ter doze filhos e mais doze. Você enten<strong>de</strong>? Os<br />
primeiros serão todos crianças e nunca vão apanhar. Os outros doze vão ficando<br />
homens. E eu pego pergunto para eles: O que é que você quer ser, meu filho?<br />
Lenhador? Então, pronto: está aqui o machado e a camisa <strong>de</strong> xadrez. Você quer ser<br />
domador <strong>de</strong> circo? Pronto: está aqui o chicote e a farda...<br />
— E no Natal, como é que você vai fazer com tanta criança?<br />
Também Minguinho tinha cada coisa! Interromper numa hora daquelas.<br />
— No Natal vou ter muito dinheiro. Comprarei um caminhão <strong>de</strong> castanhas e<br />
avelãs. Nozes, figos e passas. Tanto brinquedo que até eles vão dar e emprestar<br />
pros vizinhos pobres... E vou ter muito dinheiro, porque <strong>de</strong> agora em diante quero<br />
ser rico, rico <strong>de</strong>mais e ainda vou ganhar na Loteria...<br />
Olhei <strong>de</strong>safiante Minguinho e reprovei a sua interrupção.<br />
— Deixe acabar <strong>de</strong> contar o resto que ainda tem muito filho. Bem, meu filho,<br />
você quer ser vaqueiro? Está aqui a sela e o laço. Você quer ser maquinista do<br />
Mangaratiba? Está aqui o boné e o apito...<br />
— Pra que o apito, Zezé?<br />
— Você acaba maluquinho <strong>de</strong> tanto falar sozinho.<br />
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