21.06.2013 Views

José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)

José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)

José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

De vez em quando fungava e enxugava o rosto na blusa do uniforme. Nunca<br />

mais iria ver o meu Portuga. Nunca mais; ele se fora. Fui andando, fui andando.<br />

Parei na estrada on<strong>de</strong> ele <strong>de</strong>ixou que o chamasse <strong>de</strong> Portuga e me colocou <strong>de</strong><br />

morcego.<br />

Sentei num tronco <strong>de</strong> árvore e me encolhi todo, encostando o rosto nos<br />

joelhos.<br />

Surgiu um <strong>de</strong>sabafo gran<strong>de</strong> que eu nem esperava.<br />

“Você é malvado, Menino Jesus. Eu que pensei que você ia nascer Deus essa<br />

vez e você faz isso comigo? Por que você não gosta <strong>de</strong> mim como dos outros<br />

meninos? Eu fiquei bonzinho. Não briguei mais, estu<strong>de</strong>i as lições, <strong>de</strong>ixei <strong>de</strong> falar<br />

palavrão. Nem bunda mais eu falava. Por que você faz isso comigo, Menino Jesus?<br />

Vão cortar o meu <strong>pé</strong> <strong>de</strong> Laranja Lima e nem por isso eu me zanguei. Só chorei um<br />

pouquinho... E agora... E agora...”<br />

Nova enxurrada <strong>de</strong> lágrimas.<br />

— Eu quero o meu Portuga <strong>de</strong> volta, Menino Jesus. Você tem que me dar o<br />

meu Portuga <strong>de</strong> volta...<br />

Aí uma voz muito suave, muito doce, falou para o meu coração. Devia ser a<br />

voz amiga da árvore em que eu me sentara.<br />

— Não chore, menininho. Ele foi pro céu.<br />

Quando estava ficando <strong>de</strong> noite, já sem forças, sem po<strong>de</strong>r mesmo vomitar<br />

mais ou chorar, eu fui encontrado por Totóca sentado no <strong>de</strong>grau da entrada da Dona<br />

Helena Villas-Boas.<br />

Ele falou comigo e eu só pu<strong>de</strong> gemer.<br />

— Que é que você tem, Zezé? Fale comigo.<br />

Mas eu continuava gemendo baixinho. Totóca pôs a mão na minha testa.<br />

— Você está ar<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> lebre. O que foi, Zezé? Venha comigo, vamos para<br />

casa. Eu ajudo a você ir <strong>de</strong>vagarzinho.<br />

Consegui falar entre gemidos.<br />

— Deixe, Totóca. Eu não vou mais para aquela casa.<br />

— Vai, sim. É a nossa casa.<br />

— Eu não tenho mais nada lá. Tudo acabou.<br />

Tentou ajudar a levantar-me mas viu que eu não tinha mais forças.<br />

Enrodilhou os meus braços no seu pescoço e me carregou nos braços. Entrou em<br />

casa e me <strong>de</strong>itou na cama.<br />

— Jandira! Glória! On<strong>de</strong> está essa gente?<br />

Foi encontrar Jandira conversando na casa <strong>de</strong> Alaí<strong>de</strong>.<br />

— Jandira, Zezé está muito doente.<br />

Ela veio resmungando.<br />

— Deve ser fita <strong>de</strong> novo. Umas boas chineladas...<br />

Mas Totóca entrara no quarto nervoso.<br />

110

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!